quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Jovem Mulher casada


Em homenagem a um grande escritor português pouco conhecido, mas que eu admiro muito (nasceu em 1912 e morreu em 1987), deixo aqui um dos seus textos mais bonitos como prenda de Natal para todos os Homens tristes deste mundo e, especialmente, para os meus amigos tristes com a vida. O texto chama-se A Paixão do Urso e o nome do poeta é Luís Veiga Leitão.Deixo para trás duas crónicas que bem podem esperar. Lanço-me a este texto sugerido pela infelicidade de um amigo. Definitivamente sou infeliz quando os que me rodeiam são, ou parece que são, menos felizes.
Não suporto a desgraça dos que a confessam a plenos pulmões. E fico triste quando alguém me puxa pela aba do casaco para me dizer que o mundo foi criado para o tramar. Há gente especialista na arte de nos desconsolar. São pessoas cheias de mundo velho, que herdaram apenas o sangue pisado dos avós e dos pais, que lambem os beiços como crianças satisfeitas quando as palavras que nos podem causar angústia lhes saem da boca certas e ligeiras.
Jovem Mulher casada, ia a caminho da aldeia vizinha da sua, no coração da floresta, a duas verstas do lago Baikal, o mar Siberiano. Sentido contrário vinha um urso não menos jovem. O pêlo denunciava-lhe a idade. De repente, a duas canchas, ambos se quedaram. Olhos nos olhos, assim ficaram um tempo que ninguém soube, nem os génios da floresta. Quando ela caiu em si, um frio correu-lhe pela espinha e, trémula, ainda ganhou forças para voltar a casa. Gritou pelo marido que logo se apressou a carregar a arma de longo cano. Refeito o ânimo, foram encontrar o urso no mesmo sítio. Morto. O coração matou-o. De paixão.
Foram as bétulas, as noivas dos bosques, que o disseram entre lágrimas.
P.S. Já li este texto dezenas de vezes e sempre lhe encontro o encanto da primeira leitura. Não é assim, infelizmente, a nossa relação com a maioria dos nossos amigos. A literatura está cheia de vida mas não é a vida. Aproveito para lembrar a morte do empresário de Santarém, Joaquim Pinto, com quem partilhei há uns anos atrás uma relação de afectividade que me marcou. Joaquim Pinto era um homem sábio mas parece que teve pouca sorte com os políticos e com os projectos em que se meteu nos últimos anos. Mas a sua vida foi feita de muitas lutas ganhas. E no trato era um Homem como há poucos na vida empresarial da região. Guardo dele, acima de tudo, a ideia de que era um sonhador. Nos tempos que correm não é fácil encontrar um empresário bem relacionado com a poesia. É mais do que justo deixar-lhe aqui um abraço de despedida.

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