quarta-feira, 30 de junho de 2010

A realidade a preto e branco

Viver e trabalhar fora dos grandes centros como Lisboa e Porto custa os olhos da cara quando chega a hora da verdade, ou seja, quando queremos chegar onde os outros chegam em termos de qualidade de vida e de acesso aos bens de consumo.
Ouvir um primeiro-ministro a felicitar um jornalista de O MIRANTE por o ver de câmara na mão, enquanto também tomava notas, como aconteceu recentemente, não me deixa feliz. Pelo contrário: prova que apesar de vivermos num mundo global, onde todos podemos fazer milagres com um telemóvel de última geração, ainda somos olhados com espanto como se vivêssemos na idade da televisão a preto e branco.

Nos últimos dias tomei boa nota da denúncia pública dos nossos maiores cineastas quanto à actuação da Lusomundo que o Governo, através da PT, comprou ao Coronel Silva. E da revolta que vai no meio por a maioria dos cineastas se sentirem excluídos e, nalguns casos, censurados por os seus filmes estarem guardados em armários (Manoel de Oliveira é um deles, o que torna mais importante esta manifestação de revolta).
A impotência que atinge cada vez mais uma certa elite portuguesa, da área do cinema, do teatro, da música e de tantas outras actividades, tem para mim o sabor amargo da satisfação de verificar que estamos cada vez menos sozinhos nas vilas e aldeias do interior a lutar contra um país dominado por uma classe de políticos e empregados do Estado que vivem à custa dos bons conhecimentos e da proximidade do Poder.
Com a crise, inevitável num Estado cheio de gente obesa e retrógrada, os problemas em Lisboa e no Porto começam a ser exactamente iguais aos problemas daqueles que, por amor à terra e às suas raízes, sempre entenderam que o país merece o milagre da descentralização.
Com os erros acumulados nestes últimos anos, desde Guterres, Durão e agora Sócrates, para não falar do reinado duvidoso de Cavaco Silva, que foi incapaz de cumprir a promessa de reformar a administração pública, começam agora verdadeiramente as discussões sobre a falta de justiça nos tribunais, por ser demorada, e atrás disso a nossa falta de cultura para sermos cidadãos mais exigentes no que toca à vigilância política que devemos ter sobre quem sempre nos governou, e governa, até aos dias de hoje.

O governo de Sócrates já tem pronta a nova lei da televisão para apresentar no Parlamento. A grande novidade, como não podia deixar de ser, é a abertura da televisão aos operadores locais e regionais. As directivas europeias assim o obrigam. Mas, como em Portugal ainda vivemos todos num país do faz de conta, este Governo vai mandar para o Parlamento uma lei de televisão sem ter frequências para atribuir. E esta é apenas uma das caricaturas desta lei.

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