terça-feira, 24 de abril de 2012

O bom nome de Maria Lamas


A Câmara de Torres Novas instituiu o prémio Maria Lamas com o intuito de valorizar “estudos sobre a mulher, género e igualdade”. Como todos sabemos os políticos adoram usar os nomes dos mortos principalmente se eles foram pessoas honestas, trabalhadoras e valorosas. É o caso de Maria Lamas.
O vencedor deste prémio foi Inês Brasão com um estudo sobre criadas de servir; um prémio de dez mil euros que terá que dividir com Alexandra Oliveira, cujo trabalho de investigação sobre prostituição de rua também mereceu a atenção do júri.
Estamos a falar da primeira edição do prémio. Para espanto de toda a gente António Rodrigues já quis dar o dito pelo não dito e desfazer o que já estava feito. Não conseguiu como parecia evidente. Agora diz que não sabe quando tem dinheiro para pagar.
Este presidente da câmara não é só um pacóvio, com casa própria, que gosta de mandar uns piropos aos jovens políticos que assumem lugares de vereadores na câmara onde ele é presidente. Para além de pacóvio é um sujeito de mal com os jovens investigadores e com a memória de figuras ilustres como Maria Lamas, cujo nome foi utilizado de forma indevida e vergonhosa. Merecia um processo em tribunal. Devia levar um puxão de orelhas por ter usado em vão o nome de Maria Lamas. Os mortos, acima de tudo os mortos, também têm direito ao bom nome e à imagem. E António Rodrigues usou o nome da jornalista e mulher de cultura torrejana com a mesma facilidade com que diz umas graçolas na relação com uma jovem vereadora que ele acha que tem o direito de ridicularizar.
Maria Lamas teria gostado de conhecer este António Rodrigues que trata as pessoas de quem não gosta ao jeito dos dinossauros que terão vivido na Pedreira do Galinha.

Apresentando ao Brasil (orgulhosamente) o escritor português José Saramago
Amor em Tempos de Cólera, de Garcia Marquez, é um belo livro.
Memorial do Convento, de José  Saramago, é um livro definitivo.
Jornal do Brasil, 1986

Na noite em que Millôr Fernandes morreu viajei de avião durante quatro horas a ler “Apresentações”, um livro imperdível, para quem é admirador do grande Millôr. Quem não conhece um pouco da sua Obra não conhece a cor de um sorriso. É um dos autores contemporâneos que mais me influenciou. Faz parte de um grupo de escritores e pensadores que sempre fizeram política com a caneta e nunca quiseram as facilidades de pertencerem à manada e viverem dos expedientes da política.
“Com muita sabedoria, estudando muito, pensando muito, procurando compreender tudo e todos, um homem consegue, depois de mais ou menos quarenta anos de vida, aprender a ficar calado”.
“A vida além de curta, como todo o mundo sabe, é pequena e perto. Pouca importa o que estejam dizendo de nós na França ou no Amapá, tudo isso é muito longe. E pouco importa o tamanho da festa, a felicidade é a mesa em que estamos com as duas, as três, as quatro pessoas, e sobretudo com aquela que mais gostamos”.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Adeus Vindima!


Nos jornais, nas televisões e nas rádios não faltam opiniões e comentários de quem racha lenha para aquecer. Vai fazer história o actual momento político que vivemos. Mas nem os políticos nem os papagaios de caneta e microfone ficarão na História por boas razões.
Andamos quase todos a ganir com a crise que, verdade seja dita, pouco a pouco vai acabando com a nossa boa vida. A enxurrada é tão grande que, tudo leva a crer, mais tarde ou mais cedo vamos todos desaguar ao mar da palha e adeus vindima.
Quero dizer; vamos todos... o caraças! Vão os que pertencem à classe baixa e média. Há uma elite intocável que continua a viver à grande independentemente do Portugal murcho, ou teso, que cada um trás entre pernas, ou junto ao coração, dependendo das sensibilidades, da educação e das ideologias.
Nestes últimos meses o Governo tomou decisões que, mais do que uma enxurrada, provocaram um tsunami. Dou um exemplo: as repartições de Finanças e as conservatórias já não são obrigadas a servirem-se dos jornais para a publicação da chamada publicidade institucional. Agora vai tudo para a internet para os portais que ninguém lê mas que todos acham que é suficiente para a inevitável transparência das instituições.
Pouco a pouco, enquanto o diabo esfregou os olhos, desapareceu uma receita importante dos jornais. Quem é que deu por isso? Quantos empresários e jornalistas escreveram nos seus jornais sobre a sua indignação e a das suas associações? Nem um; nem uma linha; nem uma lágrima; nem um funeral; E quem é que sabe porquê? Eu respondo; porque a privatização de um canal da RTP é a tempestade perfeita criada pelo Governo para dar trabalho aos grandes patrões da Comunicação Social, e deixar entregues aos bichos os aselhas do costume que só valem alguma coisa em tempo de eleições ou em situações de calamidade pública.
Vai um burburinho por aí na garganta e nas canetas dos escrevinhadores de serviço mas é tudo fogo de vista. A maior parte são papagaios que falam nas televisões e trabalham nos jornais; outros falam nas televisões e são deputados; outros escrevem nos jornais e foram ministros; outros são ex-governantes, ex-deputados; quase todos funcionários públicos de ministérios e repartições, quase todos com mil pretextos para faltarem ao trabalho enquanto recebem seis vezes acima do vencimento de qualquer cidadão que trabalhou uma vida inteira e agora nem têm direito à reforma antecipada.
Nada disto é um exagero; aliás, há-de ser muito pior do que eu sei, já que não sei quase nada. Mas que eles andam por aí a servirem-se do Estado e da democracia, isso andam, e até os cães da rua percebem que eles vivem comprometidos com o facto de hoje dizerem uma coisa e amanhã fazerem outra.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

As meias dos jornalistas


“Che Guevara era um guerrilheiro que tinha prazer em torturar e matar”. Segundo outros testemunhos “era o mais destemido e corajoso de todos os guerrilheiros que combateram a ditatura de Batista”.
Às vezes falo de Che entre amigos com as palavras e as imagens dos filmes e dos livros que fizeram dele o mito que é hoje; e recebo de volta a imagem do herói transformado num psicopata apostado em derrubar o regime cubano, muito mais do que em lutar por uma sociedade mais livre e justa.
Tomei notas sobre Che numa semana em que me sentei ao lado de um jovem jornalista que usava umas meias com a figura estampada do guerrilheiro; numa semana em que revi as imagens do Papa a abençoar as mãos de Fidel Castro; numa semana ainda em que saltei da cidade da Praia, em Cabo Verde, para Barcelona, a capital da Catalunha, e em dois momentos de conversa a figura de Che foi tema de discussão e conversa.
Apesar de todos os mitos; de todos os filmes romanceados; de todas as biografias mais ou menos inventadas, gosto da ideia do Che que sorri nas meias do jornalista; que mostra a sua boina e exibe a sua barba nas camisolas penduradas nas barracas do mercado da Praia, lado a lado com as camisolas do Benfica e do Porto; e sinto-me deste tempo ao ouvir dois amigos espanhóis dizerem que Mariano Rajoy é fascista e Fidel Castro é o herói anunciado por uma máquina de propaganda que ainda hoje realiza um filme chamado Cuba, um dos países mais pobres do mundo governado até há pouco tempo pelo líder mais patético de todos os tempos.
O ressurgimento de figuras como Hitler, que foi considerado um arruaceiro sem importância quando começou a sua actividade política, ou de figuras como Guevara e Fidel, que parecem das nossas lutas de ontem, é bem possível que nunca mais se repita, quando olhamos os monitores das televisões que mobilizam as nossas atenções; lemos os jornais e ouvimos a rádio; ou somos parte de auditórios cheios de fiéis, uns mais obedientes que outros, mas quase todos fidalgos de berço de uma sociedade capitalista que, sem precisar de Colombos, dia sim dia sim anuncia ao mundo a descoberta de novos el dourados, seja na forma de viajar em low cost para o deserto de Atacama, seja na compra de um novo telemóvel que permite dormirmos e acordarmos com o mundo aos nossos pés.
Há momentos sublimes e inesquecíveis na História da Humanidade que já não se ensinam nas escolas. Hoje não há quem não conheça os papagaios que falam nas televisões à hora do jantar; todos somos íntimos das aves raras que se beijam na boca e apalpam no rabo nos filmes caseiros produzidos em série; pela certa ninguém ouve falar do padixá que conquistou Bizâncio em 1453, um homem piedoso e cruel, que lia César em latim mas era um bárbaro capaz de verter sangue como água.
“Os déspotas, quando preparam uma guerra, falam muito de paz, enquanto não estão devidamente armados”.
Cito ao acaso para me livrar deste espaço em branco que me desafia a reescrever tudo de novo e a falar do que acontece em frente do degrau da minha porta ou à beira da estrada que faço todos os dias do trabalho para casa e de casa para o trabalho. Que vontade de não querer saber o que vai agora pelo Tejo abaixo depois de aprender um pouco da música da língua crioula e catalã.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Sacanas sem lei


Numa sociedade democrática, quase 40 anos depois do 25 de Abril, é incompreensível que os tribunais percam processos judiciais, como já aconteceu comigo e com um familiar; que os tribunais demorem anos infindos a resolver um caso; que a justiça não proteja os pobres e os desgraçados que morrem de vergonha de viver; e a partir de certas situações de injustiça nunca mais recuperam a sua dignidade.
Quando temos o azar de ficar nas mãos de uma companhia de seguros, de um banco, de um hospital, de um gabinete de advogados, de uma qualquer instituição de Poder, que ninguém reze por nós porque Deus não faz milagres nem é misericordioso; talvez um padre, o padre da nossa terra, seja a nossa única solução para pedir ajuda moral. Já nem os provedores das misericórdias são o que eram dantes, embora ainda existam alguns, verdadeiras figuras da solidariedade, a quem vale a pena recorrer em casos extremos.
Os casos que são notícia nos jornais e nas televisões retratam um Portugal de oportunistas e de sacanas sem lei. Nos Estados Unidos da América Bernard Madoff foi para a cadeia em poucos dias e condenado em poucos meses. E há outros casos exemplares nos países da Europa civilizada. Em Portugal os banqueiros e os chantagistas que todos os dias nos levam a mão ao bolso, roubam o país e cada um dos cidadãos nos seus negócios sem rede e sem a vigilância das autoridades.
Até há pouco tempo defendi que o negócio dos casinos era próprio de uma sociedade fascista. Está provado que um casino é um antro de enganos e ilusões. A probabilidade de alguém ganhar alguma coisa num casino é quase nula. É tão perigoso começar a frequentar as mesas e as máquinas de jogo de um casino como começar a consumir droga. Não sei se isto se pode provar mas é possível, com um estudo sobre o assunto, chegar à conclusão que os casinos são o negócio mais enganoso do mundo. Muito mais rentável que o negócio da banha da cobra nos tempos áureos da santa ignorância.
Era assim que pensava até ontem, terça-feira, 3 de Abril de 2012, por volta do meio-dia. Descobri que estava enganado depois de me ter “passado” durantes os últimos meses com a utilização de um cartão de crédito de um banco.
Com alguma vergonha, confesso, estive quase meia hora ao balcão do banco a tentar perceber os meandros do negócio quando nos servimos do VISA e no dia 20 de cada mês não temos na conta o dinheiro suficiente para satisfazer os valores dos montantes utilizados ao longo do mês. Fiquei estarrecido. Já palpitava que os juros fossem republicanos, cerca de 25%, mas não sabia nem imaginava como é que se faz a engenharia para os banqueiros irem ao bolso do cidadão desprevenido que, como eu, não percebe patavina do sistema nem quer perceber confiante nas grandes autoridades reguladoras.
Agora já penso que o Stanley Ho é um anjinho comparado com os banqueiros portugueses. Este negócio dos cartões é uma coisa do arco-da-velha. Como o país; onde a justiça, a rainha de todas as instituições democráticas, é uma velha senhora a cheirar a fumo.