segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

2014: uma batalha

Pouca conversa; penso e digo em voz alta antes de iniciar a escrita deste texto que vai ser o último de 2013. Quando nos lerem o ano velho já lá vai. Que faça boa viagem lá para os fundos da gaveta em que vai ficar para a História. Foi um dos anos mais importantes da minha vida: vivi situações absolutamente dramáticas que julgava impossíveis. Vivi outras tão boas que só podem ser reflexo das alegrias que são concedidas a todos os que começam a entrar na idade dos moribundos. Não sei fazer balanços nem resumos; para mim a vida é uma viagem com encontro marcado e “quem fala da estupidez geral deve saber que lhe não é imune, pois até Homero dormita; deve assumi-la como risco e destino comum dos homens, consciente de ser por vezes mais inteligente e por vezes mais tolo do que o vizinho (...), porque o vento sopra onde quer e ninguém pode nunca ter a certeza de que, nesse mesmo instante ou segundos mais tarde, o vento do espírito o não abandone”.
Termino o ano deixando aqui a informação de que a assinatura de 
O MIRANTE manter-se-á nos 15,50 euros em 2014; e que vamos continuar com o jornal online de borla para quem gosta de saber notícias de proximidade; num mercado em que todos se copiam uns aos outros vamos continuar a andar por aí procurando fazer a diferença no jornalismo de referência. A nossa missão é fazer serviço público; se pudéssemos oferecíamos o jornal; como não podemos vendemos ao preço mais baixo que é possível.
O mundo está cada vez mais perigoso para os jornalistas. E o que não faltam por aí são vozes transgressoras protegidas pela imunidade do sistema e com a segurança social garantida. Nós ainda somos dos que arriscamos a pele sem vendermos a alma ao diabo. 2014 será só mais um ano nas nossas vidas; uma batalha que, no entanto, nunca poderá ser mais importante que a vida; embora todos os dias deixemos um pouco dos nossos interesses pessoais nas horas a mais de trabalho que o jornalismo exige.
JAE

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

A sorte grande da Joana

Comecei a manhã de trabalho de uma sexta-feira passada com um encontro cara a cara com Antonio José Seguro na sede da NERSANT em Torres Novas numa reunião com o Conselho Geral da associação. Querem saber o que achei do encontro ? Não digo! Se ouviram os noticiários das televisões é porque já sabem. Saí a correr de Torres Novas para Constância onde Paulo Portas e Pires de Lima apadrinharam mais um grande investimento de Paulo Fernandes, o homem forte do “Caima” e da “Cofina”, um dos maiores grupos de comunicação social do país. Querem saber o que penso do que vi e ouvi ? Não digo! Mas deixo uma citação de uma entrevista recente do Miguel Esteves Cardoso ao “Expresso”; “ O Portas ainda vai mandar nesta merda”.
Saí a correr de Constância e fui editar um texto e um vídeo a Santarém a propósito de uma conversa entre Portas e Maria do Céu Albuquerque que apanhei no momento certo. Uma hora depois estava a caminho de Lisboa para assistir ao primeiro painel de um encontro de jornalistas que estava a decorrer na Escola Superior de Comunicação Social de Lisboa. Aproveitei o lanche que me acompanha quase todos os dias e pelo caminho servi-me dele para almoço. Eram quase seis da tarde quando abandonei o congresso e fui a correr para o ISEC para o lançamento do livro de José Fidalgo que tem a chancela de O MIRANTE. Casa cheia e um orgulho enorme por fazermos parte do projecto que dá visibilidade à primeira tese de mestrado em gestão autárquica daquela universidade. Saí às oito e meia e fui fazer vinte piscinas ali a dois passos onde também vou noutras alturas menos stressadas. Às  dez e meia estava a comer um prego e um sumo de frutas. Uma hora e meia depois fui ao cinema ver o filme “Hannah Arendt” no cinema Monumental. Eram duas da manhã quando entrei num terceiro andar, ali para os lados do Largo da Estefânia, e puxei três passas do meu cachimbo que me deixaram bêbado. Adormeci com um livro no peito sem saber de que terra era.
P.S. Não me lembro de quantos sinais azuis passei, em infração, ao longo deste dia; nem de quantos telefonemas fiz e recebi;  nem de quantas vezes disse a palavra “cacete”. Mas lembro-me de a Joana me ter ligado a meio do dia e gritado:” pai, saiu-nos a sorte grande”. Tantas semanas passadas já nem me lembro que “sorte grande” foi. JAE

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

O burro do Frazão

O Ricardo Salgado, que Deus tem, arreava o burro do Frazão e todos os dias, domingos incluídos, metia-o entre varais para se fazer à estrada do meio até à antiga vinha da família Pestana, ali para os lados da “Cruz do Santinho” nos campos da Chamusca. Lembro-me desse burro quase todos os dias embora já tenham passado muitos, muitos anos, porque para além de morder ainda dava coice bravio. Nesse tempo eu olhava para o burro e via um belo cavalo. Era um jovem que montava um burro com a cabeça cheia da vaidade de quem montava um puro-sangue lusitano. Ultimamente tenho-me sentido burro a puxar a carroça na ida e no regresso do campo que o mesmo é dizer da secretária onde trabalho. E embora me sinta menos majestoso que o burro do Frazão, que Deus também tem no reino dos animais defuntos, a verdade é que o peso da carroça parece cada vez maior e os meus cascos já não aguentam as ferraduras como noutros tempos de burro mais novo.
Entusiasmado nas últimas noites com a leitura de dois livros de Cláudio Magris, “Alfabetos” e “Danúbio”, sempre com tradução de Miguel Serras Pereira, porventura o ribatejano (nascido no Porto) mais ilustre do nosso tempo, encontrei consolação para o burro que me sinto, e de certo que sou com todas as letras, rabo e orelhas, numa página de “Danúbio” onde Cláudio Magris lembra que “é um burro e não um puro sangue de coudelaria que aquece Jesus no estábulo do presépio; Homero compara Ajax, que salva os navios aqueus resistindo sozinho ao assalto dos troianos, a um burro, cuja garupa sob a carga e as pancadas se torna tão grande como o escudo de Telamónio. A força do burro tem a qualidade dos heróis clássicos, a paciência, a tranquila, humilde e indomável constância que não sai do seu caminho e que ascende mais alto do que o arranque nervoso do nobre corcel como Ulisses ascende mais alto que Páris”.
Havia mais para citar, nomeadamente quanto à sexual “vitalidade obstinada do burro que parece vingar todos os humilhados e ofendidos”, mas não há espaço que chegue. Só tenho duas linhas para concluir que nestes últimos dias tenho-me sentido, desgraçadamente, o mesmo burro de sempre, embora com uma majestosa diferença; sou com todas as letras, orelhas e rabo, muito mais o burro do Cláudio Magris que o burro do Frazão, e é isso que vou ter em conta quando festejar a entrada no Ano Novo. JAE

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

O espaço onde Moita Flores se apresentou aos escalabitanos

Não esqueço, nem esquecerei, a pompa e circunstância com que Francisco Moita Flores se veio apresentar aos escalabitanos no Café Central já lá vai quase uma década. Foi ele que escolheu aquele lugar para se apresentar à cidade na companhia dos ilustres convidados que encheram o espaço emblemático da cidade de ontem e de outros tempos.
Fechado e vandalizado há cerca de seis anos o Café Central já era. Moita Flores foi o seu último coveiro. O autarca que passou por Santarém como o Quim Barreiros da política prometeu tudo e mais umas botas para pôr Santarém no mapa; do seu trabalho só ficaram propriedades; a compra de edifícios públicos e um aumento da dívida que já era gigantesca no tempo de Rui Barreiro e companhia.
Moita Flores foi o grande estratega para a formação da empresa Águas de Santarém; para a compra do Convento de S. Francisco e do Presídio Militar; grande homem para fazer grandes negócios com o dinheiro público; naquilo em que conta mais a disponibilidade, a arte e o engenho dos gestores foi um fiasco: um digno personagem dos seus livros de ficção.
O exemplo do Café Central é um dos melhores para percebermos como Moita Flores desprezou a cidade e esteve distante daquilo que, de forma tão duvidosa, usou sempre no seu discurso político. Moita Flores foi ao Café Central apresentar-se aos escalabitanos por ser o lugar por excelência da memória da capital do Ribatejo; no pouco tempo que esteve em Santarém deixou que o espaço se tornasse um lugar fantasma, vandalizado e com custos que davam para matar a fome a algumas famílias.
Moita Flores ficou a dever ao centro histórico de Santarém a grande maioria das promessas que fez em campanha política e que caíram em saco roto. O Café Central é o símbolo máximo da falta de vontade que ele teve em trabalhar para cumprir o prometido. JAE

Comentário à noticia: http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=630&id=96535&idSeccao=10985&Action=noticia

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Elogio a Paulo Branco

Tenho um sorriso triste debruçado sobre os jornais onde leio notícias e opiniões sobre lugares considerados sagrados da cultura lisboeta. Sou frequentador de alguns desses lugares desde há mais de três décadas e tenho opinião sobre eles que na grande maioria dos casos não coincide com a opinião da maioria que escreve e “chora” nos jornais e na rádio.
A última novela foi sobre o fecho do cinema King. Passei lá noites memoráveis ao longo destes últimos anos a ver, sozinho nas salas, dos melhores filmes da minha vida; que maravilha que era ficar a ver cinema de autor à meia-noite no centro de Lisboa, em salas que me faziam lembrar as salas de cinema da minha terra e da minha região antes de fecharem também por falta de espectadores!
Aceitei sem revolta o fecho do cinema King como aceitei, sem ter voz para levantar, o encerramento do cinema da Golegã, Torres Novas, Chamusca, Entroncamento, Santarém, entre outros. Se não dão lucro!!!
Agradeço ao Paulo Branco as noites gloriosas que me proporcionou no cinema King fazendo de mim espectador único de centenas de sessões de cinema de autor; agradeço-lhe do coração pelas noites desassossegadas em que me senti personagem dos filmes tal era o sentimento de espanto por estar sozinho a usufruir da projeção de um filme só para mim numa sala para duas centenas de pessoas;  e como era bom digerir todas essas emoções, dos filmes e do lugar, a correr pela Avenida de Roma abaixo até chegar ao Saldanha ainda a tempo de comer um prego e beber uma cerveja no Galeto.
No passado fim-de-semana, morto e enterrado o King, voltei ao Nimas, lugar de visita muito menos regular. E lá estava toda a memória ainda viva do King, incluindo os livros e os colaboradores, e aquele cheiro tão especial e característico que assinala os lugares antigos mas onde ainda se respira profundamente e apetece ficar muito tempo à espera que chegue a hora do filme.
Pedi um bilhete com número de contribuinte e a senhora demorou meia hora a imprimir a factura/recibo. Para não variar fui ver um grande filme numa sala para 300 pessoas onde só estava eu e outra criatura tão fantasmagórica como eu. Alguém sabe o que é que vai acontecer ao Nimas num futuro muito próximo? Ai meus Deus, como eu já sinto saudades do Nimas e quero agradecer ao Paulo Branco o seu amor ao cinema e a sua imensa capacidade para continuar a ser empresário e produtor.
Há por aí alguma autarquia onde os políticos ainda se lembrem do que é a força do cinema e queiram criar uma marca de prestígio para vender ao país e ao mundo ?  JAE

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Palermas do século XXI

Há meia dúzia de “trutas” na política que nos envergonham e mais cedo ou mais tarde acabam com o pouco crédito que os políticos ainda gozam na opinião pública. Quem acompanha as notícias de 
O MIRANTE sabe o que pensamos da antiga Entidade Regional de Turismo e dos seus dirigentes nomeadamente Carlos Abreu e Joaquim Rosa do Céu almas gémeas no Partido Socialista e, pelo vistos, ultimamente também noutros interesses. Com a extinção da tal entidade de Turismo, que nos últimos anos não fez ponta de corno pela região e pelo seu Turismo, a promoção do turismo na região do Ribatejo passou para uma entidade chamada Região de Turismo do Alentejo. O caricato não fica por aqui; os concelhos de Alcanena, Ourém, Abrantes, Tomar, Torres Novas, Constância, Ferreira do Zêzere, Barquinha e Sardoal fazem parte da Região de Turismo do Centro que engloba concelhos como Castelo Branco, Coimbra, Aveiro e Viseu. Definir e aplicar no terreno estratégias locais e regionais de desenvolvimento do turismo para os concelhos da região do Ribatejo, em conjunto com Viseu ou Évora, por exemplo, é a mesma coisa que esperar sentado pela influência da região junto dos lobistas de Lisboa. Com esta lógica de governação ainda ganhamos o prémio de palermas do século XXI.
O que é mais curioso nestas alterações que se vão fazendo nas instituições que nos governam é a forma burra e arrogante como cada um puxa a brasa à sua sardinha. Dou um exemplo; a região de Turismo do Alentejo ficou com a responsabilidade de promover o Turismo em parte do Ribatejo mas os imóveis continuam propriedade da região de Turismo de Lisboa e Vale do Tejo.
O actual presidente da Região de Turismo do Alentejo é um homem do terreno e dá para imaginar quantos quilómetros é que ele deve fazer por semana para poder estar em todas. Se a sua missão já aparenta ser impossível imagine-se o seu trabalho lutando contra as burocracias e os poderes instalados que se adivinham com decisões como aquela que nesta altura impede a Câmara de Santarém de tomar posse da Casa do Campino e que é notícia nesta edição. Mário Soares tem razão; esta gente que nos governa precisa de um abanão. Mas a solução não passa por mandar para casa Pedro Passos Coelho  e elegermos  António José Seguro ou outro qualquer; na nossa opinião passa por reformar a classe política intermédia, esses sim, agarrados ao Poder e aos interesses instalados como a lapa à rocha, tudo contas do mesmo rosário que Mário Soares conhece muito melhor do que nós e não fala porque, para ele, a política já é só espectáculo. JAE

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Um comentário pouco político

Pedro Passos Coelho visitou a redacção de O MIRANTE no dia do fecho da nossa edição de aniversário. O primeiro-ministro vinha de Tomar onde participou numa cerimónia oficial e antes de um jantar em Santarém onde se reuniu com militantes do PSD esteve cerca de meia hora à conversa com os jornalistas de O MIRANTE.
À chegada Pedro Passos Coelho foi recebido pelos colaboradores da área administrativa e financeira do jornal e os primeiros cinco minutos de conversa foi para falar das relações profissionais que o ligavam ao nosso jornal quando ocupava o cargo de administrador da Ribtejo uma das grandes empresas do Parque do Relvão, na Carregueira, concelho da Chamusca.
 Passos Coelho não se fez rogado e depois dos cumprimentos habituais abriu a conversa perguntando se O MIRANTE continuava a manter relações com a empresa recordando as vezes em que foi interlocutor nessa relação que já tem mais de quatro anos.
Aparentemente não há nada de interessante neste comentário. Resolvi contar o episódio por achar que a atitude marca a diferença. Regra geral os políticos no exercício dos seus altos cargos não descem à terra e fingem que não têm passado. Pedro Passos Colho fez exactamente o contrário; Apesar de nos visitar na qualidade de primeiro-ministro fez questão de valorizar a antiga ligação pessoal a colaboradores do jornal e deixou para o fim da visita os assuntos que achamos por bem colocar-lhe e que nos preocupam enquanto profissionais do sector. JAE

Jornalismo de proximidade

Há muitos anos que a luta pela sobrevivência e qualidade do jornalismo deixou de ser uma luta entre jornalistas e fontes de informação. A grande luta do jornalismo, hoje e no futuro, é pelo financiamento das empresas.
Para percebermos a miséria do sistema basta lembrarmos que a classe dos jornalistas já nem se organiza em congresso e que o sindicato é um grupo de profissionais que em algumas manifestações parecem ter chegado à terra vindos de Marte tal é a sua falta de capacidade para se adaptarem aos novos tempos e aos interesses dos profissionais da Comunicação Social de que eles próprios fazem parte.

Com o advento da internet e o crescimento dos canais de televisão a forma de fazer jornalismo nunca mais será a mesma. Portugal, como sempre, vive décadas de atraso em relação a outros países desenvolvidos.
Em Portugal funciona um sistema de protecção dos grandes grupos tanto na comunicação social como noutras atividades económicas. Faz parte de uma certa forma de ser português o culto do miserabilismo por um lado e a fanfarronice por outro dos homens que são donos do dinheiro.
Voltando ao princípio: os jornais que viviam da publicidade fácil das agências, organizados em grupos que tanto facturam publicidade como agenciam a comunicação institucional desses mesmos grupos, tão depressa não vão conseguir respirar. Fechou-se um ciclo na economia mundial e a publicidade, que por obra e graça do espírito santo caía das mãos desses grupos organizados, evaporou-se ou migrou para outras plataformas como os novos canais de televisão. Explica-se assim a morte lenta de muita comunicação social e o medo que se instalou na sociedade portuguesa de que um dia destes já ninguém consegue defender-se com as armas com que é atacado.
Corremos o risco de vivermos numa democracia ainda mais musculada com os jornais e os jornalistas de um lado e a classe política do outro a tentar organizar-se contra os jornalistas?
Corremos. Já estamos a sentir isso. Recorde-se que foi um jornal marginal ao sistema (O Crime) que trouxe a público pela primeira vez o caso da licenciatura de Miguel Relvas que o fez cair em desgraça. Os jornais de referência e os principais canais de televisão fazem manchete todos os dias com assuntos de política contrariando tudo aquilo que é, aparentemente, o interesse do mercado que prefere os
assuntos de sociedade. Há uma luta pelo controlo do poder político em Portugal que envolve os grandes grupos de comunicação social do país. Por isso está na hora de descentralizar a administração pública; de acabar com os interesses instalados nos gabinetes de Lisboa; de acabar com os interesses de uma classe política que, embora a guerra verbal, acaba sempre por se proteger a si própria esteja no governo ou na oposição.

Esta edição de O MIRANTE desmente aqueles que dizem e defendem desde há anos que as empresas de comunicação social já não se conseguem financiar com a publicidade. Hoje, tal como ontem, as empresas não podem organizar-se apenas em função de uma equipa de jornalistas. Têm que pensar numa equipa comercial e administrativa/financeira e acima de tudo numa equipa que faça do jornalismo modo de vida. É isso que fazemos neste jornal. Fazemos mais ainda: procuramos que o nosso produto chegue a um número grande de consumidores e que não só seja lido como comentado e/ou criticado.
O problema é que Portugal é um país de tradições e há muita gente habituada a dobrar o joelho nas horas das aflições e a ver os seus milagres realizados ainda que a seguir a ter dobrado os joelhos tenha que dobrar a língua. Esta edição de O MIRANTE prova que Portugal tem regiões muito fortes que podem e devem ser motores de desenvolvimento do país. Prova acima de tudo que sabemos organizar-nos e que se for preciso saberemos defender contra tudo e contra todos os nossos interesses culturais e territoriais. É um luta de David contra Golias? É sim senhor! Em Almeirim há um tribunal que contraria tudo aquilo que é o exercício de uma democracia num país desenvolvido. São os próprios agentes da Justiça que o dizem à boca cheia.
Nada disto seria tolerável se o Tribunal de Almeirim tivesse processos que envolvessem grupos de interesse que se movimentam noutras regiões do país. A interioridade já não é só o Alentejo profundo ou a região de Trás-os-Montes. Em Almeirim, a 70 km de Lisboa, a justiça faz-se por um canudo.

Para premiarmos a aposta dos anunciantes nas páginas de O MIRANTE vamos continuar a investir no jornalismo de proximidade contratando profissionais que estejam o mais possível junto das populações. Vamos continuar a inventar formas de mantermos o baixo preço do jornal em papel e na internet. Vamos continuar a parceria com outros jornais e vamos aumentar o número de postos de venda; a colaboração com organizações populares; vamos continuar a fazer de O MIRANTE um jornal representativo de cada uma das cidades e aldeias do Vale do Tejo onde cada um de nós tem as suas raízes. JAE

Editorial da Edição do 26º Aniversário de O MIRANTE

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Os dias invisíveis

Vou cada vez menos ao café. Corro cada vez mais atrás do trabalho e parece que quanto mais faço mais tenho para fazer. Há dias que parecem invisíveis; chego à noite e sinto que dei um salto e nem me lembro do que comi ao almoço. Tenho tempo para fazer uma piscina regularmente, para ir ao campo fingir que percebo de agricultura; de resto estou sempre ligado ao vício como se a minha vida estivesse agora a começar. Saio de casa de manhã e chego pela noite dentro. Convivo pouco e já quase que nem conheço a maioria das pessoas com quem me cruzo. O exemplo serve não só para a terra onde nasci mas para outras que visito regulamente e das quais me sinto filho adoptivo. Foi, por isso, com surpresa que um dia destes entrei num café da Chamusca e ao dar os bons dias pediram-me um beijo. Como eram duas mulheres dei quatro beijos. Tanto no primeiro caso como no segundo foram pedidos de viva voz. Por isso não me esqueci. E por ser tão pouco beijoqueiro parece que vivi um acontecimento. E, no entanto, beijei apenas duas mulheres que me conhecem da infância e que me viram crescer como eu vi nascer os meus filhos.
Não sou do partido do ministro Rui Machete, nem nunca serei, segundo as minhas convicções. Mas não me custa admitir que tenho mais amigos no PSD do que no PS ou no PCP onde tenho as minhas raízes ideológicas tão velhas como os anos setenta. Vem a conversa a propósito do branqueamento político que se anda a fazer dos governos de José Sócrates. Porra! O homem entalou o país e foi o único responsável pela nacionalização do BPN que é o maior escândalo de corrupção depois do 25 de Abril de 1974. Diz ele com toda a calma que a sua decisão foi ingénua e baseada naquilo que sabia. Pudera! Se a minha avó não morresse ainda era viva. Em vez de um livro sobre tortura José Sócrates devia era escrever um livro sobre boas práticas de governação. E explicar como foi possível endividar o país para chegarmos ao ponto em que estamos.
Sócrates é o espelho da nossa classe política. Por muito mal que governem e contribuam para a nossa desgraça como país haverá sempre quem a seguir faça pior ou venha em defesa do que deveria ser indefensável. Mário Soares, na apresentação do livro de Sócrates, fez questão de salientar as altas notas da sua licenciatura. Já não há vergonha. JAE

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

O cheiro dos livros

Morreu recentemente um dos poetas mágicos da minha vida. António Ramos Rosa. Editamos com a chancela de O MIRANTE um dos seus melhores livros graças à amizade de um outro grande poeta chamado João Rui de Sousa, felizmente ainda vivo e a escrever da melhor poesia que se publica no mundo. Sinto orgulho por isso. Não sinto vaidade embora seja um sentimento que não me assusta. Esse trabalho, que foi muito mais prazer que trabalho, deu-me de volta ensinamentos que me ajudaram a formar como pessoa. Aprendi com Ramos Rosa a ler um livro diferente todos os dias. Foi há cerca de 20 anos e ainda mantenho o hábito. Gasto algum dinheiro a mais porque não tenho tempo para frequentar bibliotecas mas enriqueço-me a andar ao fim-de-semana de alfarrabista em alfarrabista, de livraria em livraria, conhecendo um dos mundos mais fascinantes que são as estantes e as caixas cheias de livros que muitas vezes cheiram a galinheiro mas depressa se perfumam do cheiro a frango assado.
No passado fim-de-semana comprei quatro livros por oito euros. A meio da tarde, com os livros no banco do carro, paguei quase doze euros no parque de estacionamento.
Dois desses livros são edições que já tenho na minha estante mas que me interessam por incluírem novos textos. Devorei em duas noites e duas manhãs de leitura na cama “O que Sentem as Mulheres”, de Nativel Preciado, e “Cartas a un buscador de si mesmo”, de Henri David Thoreau, assim mesmo, em língua castelhana, o que exige muito mais atenção uma vez que as campainhas do dever profissional nunca desligam na minha cabeça que está sempre a inventar.
É tão bom ter tempo para ler livros. Um dia quando morrer quero ser cremado dentro de um caixão cheio de mim e de livros; quero ir para a lua a cheirar a galinheiro e a frango assado. JAE

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Uma edição de prestígio

O MIRANTE é um jornal cheio de histórias de vida; histórias que nos contam e outras que nos atrevemos a contar. Esta semana foi pródiga em telefonemas de leitores que acham que têm uma história para contar. Desde o senhor que não teve direito a casa-de-banho num serviço de atendimento público até àquele que acha que nós temos obrigação de publicitar em texto editorial a sua actividade comercial. O comentário vem a propósito da edição do 26º aniversário de O MIRANTE, a 16 de Novembro, em que estamos a trabalhar há quase dois meses. Vamos eleger marcas locais, regionais e globais; vamos editar um jornal de aniversário feito à medida dos nossos objectivos editoriais e comerciais que será, provavelmente, o nosso melhor trabalho de sempre.
É este entusiasmo e esta entrega que apetece partilhar numa altura em que toda a gente se queixa da crise. Quem faz as terras são os Homens; quem faz as regiões são as instituições e as pessoas que vêem para além do fundo da rua onde vivem.
Entre mil pretextos para escrever o comentário desta semana escolhi falar da nossa edição de aniversário sabendo, no entanto, que muita água ainda vai correr Tejo abaixo até alcançarmos os nossos objectivos. Fica aqui o testemunho que é uma prova de confiança na equipa de O MIRANTE e nos profissionais que todas as semanas produzem e editam o jornal regional que é líder de mercado.

Na passada semana o ministro da Educação de Angola, Pinda Simão, estave em Santarém de visita à Escola Profissional do Vale do Tejo. Numa altura em que tanto se fala das relações entre os dois países, e é notícia aquilo que interessa só aos politiqueiros do costume, importa registar a passagem da comitiva angola que acabou em Portugal um périplo por alguns países da América Latina. Como vem sendo habitual a visita de trabalho do ministro angolano a Santarém, que durou várias horas e incluiu almoço e visita à escola e à cidade, não interessou à generalidade da comunicação social nem às entidades que mais tinham a ganhar com o acontecimento. Enquanto as televisões e alguns jornais fazem a agenda do Governo, vão servindo em horário nobre os enlatados do costume, o país continua a ser um sítio mal frequentado como escreveu um dia o poeta Alexandre O’Neill que deixou em testamento parte da sua biblioteca à vila de Constância. JAE

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Moita Flores e os amigos

Francisco Moita Flores fez História em Santarém ao dar uma entrevista ao jornal O Ribatejo 15 dias antes das últimas eleições autárquicas onde só falta chamar “Pai de Santo” a Ricardo Gonçalves. Moita Flores deixou Ricardo Gonçalves no seu lugar de presidente de câmara mas por razões que não consegue explicar em quatro páginas de entrevista ao referido jornal resolveu acusá-lo publicamente de não ter cabeça para a herança que lhe deixou entre muitas outras acusações que pareciam uma confissão bêbeda.
Para um homem que se diz franciscano e de bons costumes convinha perceber que razões o levaram a querer contribuir para a derrota política do homem que deixou no seu lugar e que o libertou para outras guerras políticas que abraçou com grande empenho.
Tendo em conta a vitória anunciada de Ricardo Gonçalves, já que as sondagens do PS e do PSD nunca foram muito divergentes, e deram sempre a vitória a Ricardo Gonçalves, Moita Flores julgou-se com capacidade para intervir no processo eleitoral em Santarém dizendo “cobras e lagartos” de Ricardo Gonçalves para prejudicar, ou atropelar, a vitória que parecia cantar-lhe desde que assumiu a candidatura. E que acabou por se confirmar com uma votação que quase chegava à maioria absoluta.
Moita Flores saiu derrotado da tentativa de minimizar Ricardo Gonçalves e acabou também perdedor no concelho de Oeiras onde, durante a campanha eleitoral, só faltaram tiros de pistola para animar a festa.
Não vi até agora nenhum sinal de arrependimento sobre declarações tão infelizes de alguém que saiu a meio do mandato para ir cuidar da sua vidinha. Por entender que a História não pode ser contada só por uma parte deixo aqui este registo para mais tarde recordar. Moita Flores é muito mais de fazer inimigos do que de fazer amigos. Mas engana muito bem. Tiro-lhe o meu chapéu de provinciano e ribatejano charnequenho. JAE

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Outono, Inverno, Primavera, Verão… Outono*

O Outono é a melhor das estações para mudarmos de vida. O Outono tem o rosto do sono; de um dia para o outro estamos no Outono como saímos e entramos involuntariamente nos olhos de uma mulher de 30 anos com umas pálpebras de uma mulher de 60. O Outono é a revolução da Primavera; a escultura que fica da primeira derrota do artista que anda a brincar com a natureza. O Outono chama-se Constância, Aldeia do Mato, Dornes, Azinhaga, Valada, Palhota, Azambuja, Porto das Mulheres, nomes de aldeias e lugares que fazem lembrar os campos do Ribatejo no tempo das antigas searas de aveia, cevada e girassol. O Outono é o rio Tejo renascido com as primeiras águas da chuva que ajudam a limpar as marachas poluídas de todos os banquetes de Verão à beira-rio. O Outono é a estação das palavras mágicas que encontramos no romance “As Bicicletas em Setembro” do escritor Baptista-Bastos.
O Outono é  residência oficial da paisagem ribatejana; de um dia para o outro o pôr-do-sol parece que engoliu o arco-íris; depois das colheitas do tomate, do milho e das uvas, as terras do campo ficam quase nuas, com o sexo escondido no restolho, e entre o rabisco que é alimento de muitas e variadas bocas.
O Outono é a melhor das estações do ano para recordarmos os nossos avós; para comermos os últimos figos directamente da figueira; para visitarmos um lar de terceira idade com os bolsos cheios de caramelos;
Este ano festejo o meu aniversário em pleno Outono, quando caem as folhas das árvores, quando as raízes adormecem, quando os cogumelos selvagens começam a valer dinheiro. Para o ano espero comemorar o aniversário no Inverno; e no outro ano em plena Primavera, e  no ano seguinte no Verão, e assim sucessivamente de estação em estação até ao Outono final.
*Título inspirado no filme “Primavera, Verão, Outono, Inverno… Primavera” que é um dos filmes da minha vida. JAE

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Uma democracia pelintra

Fico satisfeito por ver que as televisões e os jornais, na generalidade, não vão fazer a cobertura da campanha eleitoral para as eleições autárquicas. Finalmente o Poder da Comissão Nacional de Eleições fez-se ouvir. Com as televisões e a grande maioria dos jornais de referência a viverem graves problemas financeiros, com a queda do investimento publicitário, não há dinheiro para pagar as multas. Deus escreve direito por linhas tortas. Finalmente os políticos vão provar do seu próprio veneno. A partir de agora é certo que vão alterar a lei. Mas é a crise financeira que os obriga a serem responsáveis. É lamentável. Por aqui se vê a pelintrice desta democracia.
A política é cada vez mais a disciplina mais pobre da cultura. Sobram os vendilhões do templo. Isso não faz com que não acreditemos numa nova geração de políticos de quem se espera muito trabalho para darem a volta a isto.
Natália Correia acaba de ser homenageada com a publicação de uma Biografia da autoria de Fernando Dacosta. Quem tiver memória lembra-se da polémica à volta da sua reforma e das angústias que viveu enquanto ia gritando que “a pobreza é a grande arma de domínio utilizada pelos ricos, mas eu prefiro desaparecer a submeter-me”.
Num tempo em que a palavra Pátria perdeu muito do seu simbolismo e significado, relembro Natália Correia por ser a grande Mátria e a sua Obra política e literária estarem cheias de razão antes do tempo. Ficam aqui duas frases que estão espelhadas na biografia de Fernando Dacosta; “A Europa será dentro de escassos anos dominada pelo quarto mundo, um mundo composto por três gigantescas maiorias de anatematizados: a dos idosos, a dos desempregados e a dos migrantes. As pressões que exercerão mudarão profundamente as estruturas de trabalho, lazer, produtividade (:)”. “Os detentores dos poderes julgam que a vida se resolve com produtividade, com quantidade. O problema actual do Homem não é, porém, esse: é o da desumanização, o do cansaço, o da falta de desejo, tanto a nível individual como coletivo. Passa-se fome por questões políticas, não técnicas, por problemas de distribuição, não de produção. Precisamos de inventar novas preguiças para criar novas sobrevivências”. JAE

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Uma democracia pelintra

Fico satisfeito por ver que as televisões e os jornais, na generalidade, não vão fazer a cobertura da campanha eleitoral para as eleições autárquicas. Finalmente o Poder da Comissão Nacional de Eleições fez-se ouvir. Com as televisões e a grande maioria dos jornais de referência a viverem graves problemas financeiros, com a queda do investimento publicitário, não há dinheiro para pagar as multas. Deus escreve direito por linhas tortas. Finalmente os políticos vão provar do seu próprio veneno. A partir de agora é certo que vão alterar a lei. Mas é a crise financeira que os obriga a serem responsáveis. É lamentável. Por aqui se vê a pelintrice desta democracia.
A política é cada vez mais a disciplina mais pobre da cultura. Sobram os vendilhões do templo. Isso não faz com que não acreditemos numa nova geração de políticos de quem se espera muito trabalho para darem a volta a isto.
Natália Correia acaba de ser homenageada com a publicação de uma Biografia da autoria de Fernando Dacosta. Quem tiver memória lembra-se da polémica à volta da sua reforma e das angústias que viveu enquanto ia gritando que “a pobreza é a grande arma de domínio utilizada pelos ricos, mas eu prefiro desaparecer a submeter-me”.
Num tempo em que a palavra Pátria perdeu muito do seu simbolismo e significado, relembro Natália Correia por ser a grande Mátria e a sua Obra política e literária estarem cheias de razão antes do tempo. Ficam aqui duas frases que estão espelhadas na biografia de Fernando Dacosta; “A Europa será dentro de escassos anos dominada pelo quarto mundo, um mundo composto por três gigantescas maiorias de anatematizados: a dos idosos, a dos desempregados e a dos migrantes. As pressões que exercerão mudarão profundamente as estruturas de trabalho, lazer, produtividade (:)”. “Os detentores dos poderes julgam que a vida se resolve com produtividade, com quantidade. O problema actual do Homem não é, porém, esse: é o da desumanização, o do cansaço, o da falta de desejo, tanto a nível individual como coletivo. Passa-se fome por questões políticas, não técnicas, por problemas de distribuição, não de produção. Precisamos de inventar novas preguiças para criar novas sobrevivências”. JAE

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

O fidalgote do associativismo português

Troco uma tarde no campo junto ao Tejo pelo prazer de escrever uma crónica. Troco as palavras pela gadanha ou pela enxada embora não ande a cavar mas a endireitar a terra. Deixo no caderno a frase que mais encheu a folha do dia de Terça-feira: os dirigentes da CAP têm como refém o Ministério da Agricultura. Basta o CDS chegar ao Poder e eles fazem o que querem. É vê-los quase todos os dias na televisão a fingirem que têm soluções para o país. Quanto aos agricultores e aos seus interesses é o que se sabe. Não quero dizer mal. Deixo no caderno de apontamentos o fruto da má-língua que pratiquei uma noite destas com o Sérgio Carrinho que se prepara para deixar sem dor a presidência da câmara. Quem diria!!! Como uma dúzia de figos directamente da árvore e outra dúzia que me foram dados num saco embrulhados em folhas de figueira como a minha avó me oferecia há mais de uma eternidade. Há lá coisa melhor que comer figos e esquecer o assunto para a próxima crónica ou comentário? O António Rodrigues vai deixar Torres Novas e vai trabalhar para Timor. Toda a gente sabe, desde há muito tempo, que ele não quer passar pelo martírio que passa o Silvino Sequeira e o Rosa do Céu e todos aqueles que fizeram da política a sua profissão e de repente parecem aves raras sem saberem onde poisar. O mundo foge-lhes debaixo dos pés. Os rapazes andam no recreio da escola a mijar para cima das pedras e eles passam na rua e à noite vão sonhar que é o povo que agora mija para cima deles só porque deixaram de controlar o Poder. Sem o perfume do Poder ficam a cheirar mal como a água parada do rio. Não é verdade mas é assim que eles se sentem e cheiram.
Este comentário é uma cedência de uma tarde ao prazer de usar a gadanha e deixar a prática da escrita para o momento do fecho da edição. Tinha meia hora para cumprir o timing que me foi dado pelos gráficos. Escrevi este pequeno texto sem dizer mal de ninguém em menos de meia hora. Vou agora ali a Abrantes comer uma tigelada  e ainda terei tempo de mandar o título do comentário pelo telemóvel enquanto penso se hei-de ou não tirar daqui o “dono” da CAP, João Machado, que esta semana voltei a encontrar na PSP numa queixa contra mim e este jornal que, pelos vistos, não é terreno agrícola que interesse ao fidalgote do associativismo português. JAE

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Os Tendeiros foram à Chamusca e os Bombeiros querem ser sociedade secreta

A praça de toiros da Chamusca foi entregue a uma empresa de uma família com o apelido Tendeiro que, segundo consta, já não organizou directamente a última corrida realizada no sábado dia 31 de Agosto.
Dizem os empresários que conheço, e nem eu conheço muitos nem existem assim tantos, que nesta altura não querem a praça da Chamusca nem dada. Pelos vistos a empresa da família Tendeiro também não. É pena que os responsáveis pela praça de toiros da Chamusca continuem a enganar-se tantas vezes na escolha dos empresários permitindo assim que muita gente, ligada directa ou indirectamente aos espectáculos, na condição de fornecedores de serviços, também seja enganada e prejudicada.
A direcção da Misericórdia da Chamusca não pode ser inocente neste assunto. Há muitos anos que a praça de toiros é mal entregue e não serve a festa nem os aficionados. Por mim podem continuar assim mais meio século. Mas a Chamusca merecia que a praça fizesse parte do calendário das melhores festas de toiros; que todos os anos a tradição voltasse a ser o que era. A Câmara Municipal da Chamusca sempre teve mãos largas para ajudar. Se não aproveitam e não organizam como devem é porque querem tudo para eles ou subestimam a importância da praça e do público que gosta desta arena e desta terra situada no coração do Ribatejo.
Uma última nota só para dizer que a Chamusca tem dois dos grupos de forcados mais prestígiados do país, o que quer dizer que, só à conta deles, meia praça está quase sempre garantida. Então onde é que está o problema? Só pode ser falta de interesse ou a satisfação de muitos interesses instalados.
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Os Bombeiros da Chamusca inauguraram um edifício nas traseiras do Quartel onde instalaram novas camaratas e um centro de formação. A cerimónia de inauguração teve um momento solene de descerramento de uma placa de homenagem a José Monteiro Januário, o engenheiro civil com gabinete na Chamusca que terá sido o responsável técnico pela Obra. Sou sócio da associação há mais de 30 anos e não fui convidado. A O MIRANTE não chegou informação sobre a inauguração e a homenagem. Tentamos fazer notícia à posteriori e mandaram dizer que ainda não era a altura apropriada. Permitam que pergunte; os Bombeiros da Chamusca já foram privatizados? Deixou de ser associação e passou a ser a casa de uns Senhores que estão lá há tanto tempo como Cristo morreu na cruz? Será que estou a pagar as quotas mensais aos anjinhos do céu e ainda não percebi em que mundo é que vivo? Se calhar já morri e é a minha alma que está parva por ainda não ter encarnado em quem devia. JAE

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Ter a fama e o proveito

Há pessoas que não me conhecem e falam de mim como se fossem íntimas mandando recados que me fazem sorrir. Há outras que reencontro por aí e, muitas vezes, não dou a atenção que merecem porque tenho o arroz ao lume ou estou cansado para mais do que dois dedos de conversa. Precisava do dobro do tempo para fazer tudo o que gosto e me dá prazer no exercício da profissão. Escrever crónicas é fácil. Ir para a rua em reportagem e desencantar boas histórias é que não é para todos. E eu sou daqueles que começa a ter o cu pesado e falta de paciência. Tirar uma entrevista do gravador é castigo maior que comer cebola cozida; chegar a casa às nove da noite e fazer serão a cavar com a mesma enxada é castigo maior que dor de dentes.
Os casos de tribunal já não me tiram o sono. Habituei-me a ser presa fácil dos políticos que se servem dos tribunais para amedrontarem. Recentemente fui condenado em tribunal pela primeira vez; senti-me tão injustiçado que foi com orgulho que vi o meu nome escarrapachado nos jornais. A justiça já não me assusta tanto; a classe política já não me desilude; o país italianizou-se, como eu, aliás, sempre previ, e daqui para a frente vai ser ainda pior. Quem anda nesta vida ou tem coração ou o melhor é arrumar as botas.
Temos a fama e o proveito de editarmos  um jornal que figura entre os dez maiores de circulação nacional. Montámos uma máquina para vinte e três concelhos que nos dá mais visibilidade que os outros jornais conseguem com a sua presença em todo o território nacional. O governo boicotou; nós demos a volta por cima; a crise fez diminuir o investimento publicitário: nós abrimos o passo e estamos a cumprir os objectivos.
Dificilmente resistiremos a um acto terrorista da justiça ou de algum político influente que aposte tudo na nossa insolvência. Por sabermos que o sistema apodreceu não podemos ser ingénuos.
Como sempre, e até que haja mundo, o que não nos mata deixa-nos mais fortes. JAE

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Manuel Subtil

Na sexta-feira andei pelas ruas de Tomar de charrete ao lado do presidente da câmara, Carlos Carrão. Conheci o Senhor Vítor Rodrigues, que era o condutor da charrete e um dos empresários que vai desenvolver o negócio, e tomei boa nota da doença que atingiu um jornalista que vive e trabalha em Tomar chamado Manuel Subtil.
Conheci-o há cerca de 20 anos. Há duas ou três situações em que trabalhei ao seu lado que me deram boas indicações sobre o homem tanto quanto sobre o profissional. Sempre que o vejo a trabalhar digo para comigo: este tipo podia trabalhar no nosso jornal. Já não há muita gente que vista assim a camisola. Entretanto soube que tinha adoecido. Na sexta-feira, quando cheguei ao portão da Mata dos Sete Montes, estava ele a começar o seu trabalho. Foi o primeiro a disparar a máquina para registar o acontecimento. Só mais tarde chegaram os homens do gabinete de comunicação da câmara e das rádios locais.
A situação do “Cidade de Tomar”, para o qual trabalha, não é a melhor financeiramente. Segundo consta a empresa editora está em lay-off. Mas o Manuel Subtil não liga a isso. Mesmo diminuído, por causa do problema de saúde, diz com um sorriso que parar é morrer e que o trabalho limpa a alma. Nesse dia a esposa estava por perto. Enquanto ele trabalhava conversamos um pouco sobre a maldita doença que o escolheu. Parece que não é daquelas que se consegue atrasar com medicamentos. Mas não adiantamos muito mais. O Subtil estava ali por perto a trabalhar e mesmo diminuído fisicamente saltava de um lado para o outro. Não ia acompanhar-nos na viagem de charrete pela cidade mas decerto que ia continuar a trabalhar nessa manhã noutros assuntos da agenda.
 Se há pessoas boas no mundo uma delas é o Manuel Subtil. Não é preciso ser seu amigo para gostar dele; ouvi-o centenas de vezes contar os saltos que dava para poder trabalhar, de noite e de dia, para o jornal e para a rádio; para se multiplicar e poder estar em vários lugares ao mesmo tempo.  Manuel Subtil é o verdadeiro jornalista repórter que todos gostávamos de ter na nossa equipa. JAE

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

A prostituição e a política

O concelho de Vila Franca de Xira é entre todos os que conheço o que tem mais publicidade selvagem por metro quadrado. É uma situação lamentável que piora em ano de eleições com os candidatos e os partidos políticos a contribuírem para um tipo de poluição terceiro mundista que não só agride o cidadão como se presta a negócios pouco claros, para além de ser factor de risco no trânsito que nunca é contabilizado e põe em perigo vidas e bens.
A poucos dias das eleições autárquicas vale a pena recordar que a Comissão Nacional de Eleições (CNE ) proíbe desde 25 de Junho, “propaganda política feita directa ou indirectamente através dos meios de publicidade comercial em jornais ou outros meios de comunicação social, conforme resulta do disposto no artigo 46.º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto”. Diz a lei que “o legislador teve em vista impedir que através da compra de espaços ou serviços por parte das forças políticas se viesse a introduzir um factor de desigualdade entre elas, derivado das suas disponibilidades financeiras”.
Como é fácil observar esta limitação não contempla a publicidade exterior, a publicidade entregue por correio, ou de mão em mão, ou a depositada directamente na caixa do correio, ou debaixo da porta, ou gritada através de aparelhagem sonora em carros próprios ou alugados. Vale tudo para fazer chegar a mensagem política; menos publicidade em jornais e televisões.
O mundo mudou nos últimos anos, mudou radicalmente em certos aspectos; neste continua velho como nos tempos da outra Senhora.
Desde 2005 que O MIRANTE não faz a cobertura do período oficial de campanha eleitoral por considerarmos que a legislação nos obriga a cumprir directivas de 1975 que tornam impossível o nosso trabalho. Assim vamos continuar até que os políticos resolvam o problema. Com legislação tão apertada ficamos admirados como as televisões e os jornais de divulgação nacional conseguem cumprir a lei. De verdade quem tem a obrigação de fiscalizar faz como no caso da prostituição; é proibida a prática da prostituição em Portugal mas todos os dias se publicam páginas inteiras de anúncios a oferecer trabalho nesta área. E toda a gente fecha os olhos. Ora aqui está uma boa associação entre a actividade política e outros trabalhos também considerados de grande utilidade para a democracia.
Nota: a realidade da publicidade selvagem no concelho de Vila Franca de Xira serviu para a introdução do tema principal deste texto. Não me cansarei de alertar para este negócio que considero “sujo” e que suja as ruas e as estradas da nossa vida.
JAE

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Uma seara de girassóis

Em tempo de férias devemos escrever de forma mais ligeira e despreocupada? As palavras também vão a banhos? Claro que sim. Não é por acaso que a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista acaba de avisar que finalmente conseguiu aderir às novas tecnologias. Num tempo em que a classe de jornalistas está a desaparecer eis que a CCPJ se moderniza e começa a contar no número de instituições que não servem para nada.
Estamos a viver uma época de verdadeira mudança de ciclo no jornalismo português. Sim, falo de Portugal, por que na maioria dos países da Europa democrática a profissão e o negócio conhecem outras evoluções por onde ainda iremos passar se até lá as instituições democráticas não entrarem em insolvência.
Nos últimos cinco anos fecharam mais de metade dos jornais locais e regionais. As redacções dos grandes jornais decresceram mais de metade. As vendas dos jornais diários são ridículas comparadas com as vendas de há dez anos.
As televisões facturam publicidade às grandes agências com 90% de desconto sobre a tabela de publicidade oficial. Os diários de circulação nacional baixaram os preços de inserção ao nível dos jornais locais. Alguns jornais locais e regionais oferecem publicidade ao preço da chuva porque entretanto baixaram as tiragens para números miseráveis e estão-se marimbando  para o papel de serviço público que lhe cabe.
A cada aniversário do 25 de Abril fazemos mais um funeral à liberdade. Quem é que sabe que todos os processos contra jornalistas são considerados urgentes em Tribunal? Quem são os jornalistas com poder na imprensa portuguesa que falam disso com indignação?  A verdade é que em Portugal julga-se mais depressa um jornalista que um assaltante à mão armada ou alguém que dê um tiro certeiro na cabeça de outro. Quem tem dois dedos de testa não fica preocupado ao saber disto? Um país que demora dez anos a julgar um assassino, e que em meses dá a volta à vida de um jornalista, não é um país perigoso?
Em Portugal ainda há lugar para o jornalismo que não seja aquela coisa merdosa que se faz em televisão todos os dias e que nos entra pela casa dentro nos intervalos dos anúncios?
E é democrático estes senhores da política continuarem a servir canais de televisão a uma elite empresarial quando na maior parte dos países da Europa o sinal de televisão já é tão democrático como todos os outros negócios de comunicação social?
O que acabo de escrever não conta para o totobola. Isto é um desabafo que devo aos meus leitores.
 Mesmo em férias as nossas palavras devem mergulhar até onde o fundo do mar permite que vejamos uma seara de girassóis JAE

quarta-feira, 24 de julho de 2013

O Rui Barreiro de saias

Santarém é uma aldeia. Falo do concelho no seu todo e não da cidade. Na passada semana fui para os lados de Albergaria receber uma terapia. A gente não sabe nem sonha quantos recantos perdidos tem este concelho e quantos velhos sorridentes, e desdentados, se sentam nos bancos à beira da estrada para nos saudarem e dizerem olhem que estamos aqui venham daí para dois dedos de conversa.
Parei o carro na estrada principal às duas da tarde e fui à minha vida. Terapia de uma hora e mais uma experiência interessante. Mais interessante ainda foi a presença de uma mosca que me deu que fazer todo o tempo. Na hora de acertar contas, sentado de frente para a terapeuta, recebi a explicação para a presença da mosca durante toda a sessão. “Foi um incidente, desculpe, mas eu não gosto de matar animais”. Já lhe tinha perdoado quando oiço tocar a campainha da casa. A terapeuta vai à porta e regressa com a informação que tenho a caixa do carro aberta. Pede-me a chave e vem à rua. Venho atrás dela descalço e confirmo que o carro estava lá. Mais tarde confirmo que também lá estava a mala de mão mais a máquina fotográfica que me acompanha para todo o lado. Nem quero acreditar: um carro parado cerca de uma hora à beira da estrada, de mala aberta, cheio de outras malas mais pequenas, e ninguém deitou a mão nem para levar um livro.
Regresso à cidade e vou vendo a publicidade que os políticos já espalharam nas rotundas. Olho pela primeira vez para o cartaz da candidata Idália Serrão e lembro-me do tempo em que ela se chamava Idália Moniz e era a alma gémea de Rui Barreiro na gestão da autarquia. Parece que entretanto se zangaram; fizeram tantas asneiras que viraram-se de costas; Como não se ouve falar de Rui Barreiro, e em política não há inocentes, pergunto-me: politicamente a Idália Serrão não é o Rui Barreiro de saias? Eu acho que é. Aliás… não tenho dúvidas. Conheço-os há muitos anos e sei como eles são gente politicamente fraquinha. Por isso se aliam e se zangam com a mesma facilidade que uma mosca anula uma hora de descanso. JAE

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Os mários soares da liberdade

Sou o homem mais feliz ao cimo da terra. Todos os dias vivo para criar a eternidade. Nestes últimos dias esta neblina foi ouro sobre azul para umas merecidas férias do sol deste Verão que ainda vai a menos de meio. Mesmo a trabalhar, quando a maioria goza férias ou vive dos rendimentos, sinto-me o mais sortudo dos homens. Tenho um jardim à porta de casa; um rio do outro lado da minha rua; e ao fundo do meu quintal começa a zona de charneca ribatejana que é tão grande e diversificada que se confunde, uns quilómetros mais a nascente, com a charneca alentejana.
Apesar de tudo, ou por isso tudo, todos os dias me levanto com o espírito dos meus 22 anos quando estive de malas feitas para emigrar. Em nome dos meus avós e dos meus pais desejo todos os dias que a terra seja pesada a Salazar e aos seus comparsas. Mas em nome do meu trabalho de meio século estou cada vez mais descontente com este país de medíocres e corruptos. Revejo-me em alguns homens políticos de proximidade mas a grande maioria mandou às urtigas os valores conquistados com o 25 de Abril. A maioria dos nossos dirigentes trabalha para o Estado e são donos de empresas: ou são dirigentes públicos e têm interesses privados na mesma área em que trabalham para o Estado. A justiça é um perigo para um cidadão indefeso. A auto-gestão em que se encontra a magistratura portuguesa é mais perigosa para um cidadão do que o excesso de ozono no ar. Morrer de boca aberta a caminhar por aí é muito mais digno do que morrer nas mãos de um juiz ignorante e de uma justiça dos tempos de antanho. Estamos todos a andar para trás. O sistema democrático em que vivemos está desacreditado e este sistema político começa a ser tão duvidoso e perigoso como o de Salazar. Nunca pensei escrever isto e muito menos pensei que podia ter medo de viver no meu país depois do que vi e ouvi aos mários soares da liberdade. JAE

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Os homens bons

São quase duas horas da tarde de um sábado e estou em Santarém a destilar. Acabei de fazer uma jornada de trabalho em Vila Franca de Xira acompanhando a homenagem ao campino, a inauguração de um monumento ao trabalhador, a prova de perícia de campinos na praça de toiros e, logo de seguida, a bênção das motos do Motoclube de Alverca junto à Igreja dos Pastorinhos.
Pelo meio falei com o senhor António, um “Zé Ninguém”, a quem comprei um barrete por dois euros, vive no Barreiro e diz que não tem nada de seu. Dei uma volta pelo comércio de Vila Franca de Xira que tem as montras enfeitadas, bebi dois cafés e duas garrafas de água e, Heureca!!, fiz quase 250 km de moto, sensação que já não experimentava há muito tempo.
Vou agora editar os vídeos e escrever textos, curtos, o mais possível, que o papel está caro e terça-feira os editores no fecho do jornal têm que tomar opções entre as fotos da festa, do desporto e da cultura, da política e de sociedade. Como é evidente, em tempo de vacas magras, o que fica no computador, à falta de espaço, são as fotos da festa.
Tenho o dia ganho porque a trabalhar acabo sempre por me divertir. Vi a moto dos meus sonhos na concentração; ouvi o padre da Igreja dos Pastorinhos perguntar por uma Ducati e assisti a uma bênção que me comoveu o que condiz com o meu agnosticismo cada vez mais firme e inabalável. De todas as formas as palavras da Bíblia, na boca dos homens bons, tomam sempre um sentido divino; muito mais do que se forem lidas no silêncio das nossas casas. JAE

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Um exemplo para o País

A Câmara de Vila Franca de Xira atribuiu quase um milhão de euros em subsídios às associações do concelho. Fui ver a cerimónia da assinatura de alguns protocolos. Estavam lá todos ou quase todos; políticos e dirigentes associativos. Embora nem todas as caras me sejam familiares com alguma ajuda vou sabendo quem é quem. E percebo a excelente forma como Rosinha acaba o seu mandato à frente da autarquia. Já no final da cerimónia, com um cachecol de uma associação local ao pescoço, Rosinha ouve os elogios mais afectuosos. Minutos antes tinha acabado de “atingir” com uma indirecta um dirigente associativo que a veio cumprimentar meio comprometido. Olhe que eu quero saber tudo por si e não quero recadinhos ouviu?... Sim senhora presidente, fique descansada! Sacanas, não sabem separar a política do trabalho associativo, desabafou já com o seu interlocutor à distância. No pouco tempo que convivemos Maria da Luz Rosinha mostrou que está em forma e que faz toda a diferença entre aqueles que estão na política para servirem e os que vão para a política para enriquecerem. Rosinha faz ainda a diferença em relação aos seus camaradas de partido (PS) de algumas autarquias da região ribatejana: em comparação com muitos que estão no Poder e outros que foram apeados por manifesta falta de competência e qualidades humanas. Numa altura em que a classe política anda pelas horas da amargura parece-me justo deixar aqui um bom exemplo de liderança num concelho que em termos de gestão é um exemplo para o país. JAE

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Uma terra de papalvos

É ridícula a discussão da ligação entre a organização da Feira do Ribatejo e a cidade de Santarém. É ridícula e dá vontade de rir. Moita Flores bem tentou abanar o sistema mas depressa percebeu que tinha que dar o flanco. E perdeu a guerra, ou seja, a cidade perdeu mais uma oportunidade de ter alguém com estatuto que a defenda de uns tipos oportunistas que fazem a gestão de um espaço a pensarem no lucro de uma Feira que herdaram de gente de bem, bairrista, que fazia tudo a pensar na cidade e naquilo que a Feira podia ajudar a cidade e quem nela vive e investe.
Uma vez por ano a administração do CNEMA mostra-se ao país ao lado de gente do Governo, sejam eles quem forem, e marimbam-se para os interesses da cidade e da região. A Câmara de Santarém tinha obrigação de lançar um debate público sobre a organização da Feira e os interesses que estão instalados no CNEMA. Ludgero Mendes fez bem em não se calar. Mas é muito pouco criticar; é preciso partir a loiça e desmascarar os interesses instalados;
Não só em nome de Santarém; também em nome de uma região que merece muito mais que uma Feira organizada por uns senhores cuja fixação é aumentarem de ano para ano o número de visitantes com um programa recheado de artistas. São todos uns papalvos e nós somos como eles que corremos atrás dos foguetes e ainda apanhamos as canas. JAE

quarta-feira, 5 de junho de 2013

João Maurício

Este comentário é da hora do almoço da passada segunda-feira  3 de Junho. O relatório de um colega de trabalho informava que não tinha sido possível chegar à conversa com determinada pessoa porque entretanto tinha falecido um seu sócio. Perguntamos se era o senhor João Maurício e a resposta foi um encolher de ombros.
Chegamos ao local de trabalho, que não o da mesa do almoço, e fomos à procura da notícia. Chegou sem surpresa porque a conversa já o fazia adivinhar; um dos administradores da Naxol, João Maurício, faleceu no passado dia 2 de Abril. Não éramos íntimos mas éramos amigos há muitos anos. A Naxol é parceira deste jornal quase desde a sua fundação. E o Senhor João Maurício era, inclusive, dirigente associativo. A sua morte passou despercebida. Deixamos de o ver nos locais habituais mas nada mudou à face da terra. Nem demos pela sua falta. Como ele provavelmente não daria pela nossa se fossemos nós a morrer de um dia para o outro.
O MIRANTE é um jornal regional com pretensões a ser local desde Mação até Vila Franca de Xira. Há mais de 20 anos que esta mensagem é passada todos os dias a quem trabalha neste jornal seja na redacção, no sector comercial ou administrativo. Temos afirmado a nossa diferença ao longo dos anos mas mesmo assim ainda temos muito caminho para fazer. Dito de outra forma: quando alguém que trabalha num departamento importante desta empresa acha que não é notícia a morte de um empresário que era nosso parceiro e nosso amigo chegamos à conclusão que uma só vida é muito pouco para nos fazermos ouvir nas questões mais importantes.
Como ainda não desistimos, e sabemos reconhecer as nossas limitações, que são muito mais fáceis de resolver que algumas doenças que levam à morte física, fazemos do nosso trabalho matéria para o comentário da semana. É, de certa forma, uma homenagem à memória de João Maurício. Não éramos íntimos nem nada parecido mas o Senhor Maurício era uma pessoa de quem gostávamos e a notícia da sua morte deixou uma amargura que faz doer. JAE

quarta-feira, 29 de maio de 2013

O anonimato ontem e hoje

Há cerca de 20 anos, quando éramos dois gatos pingados a escreverem neste jornal, recebemos durante quase dois anos cartas anónimas que procuravam ofender e caluniar. Pelo tipo de letra e pelas mensagens era fácil perceber que eram escritas sempre pela mesma pessoa. Na altura gostava de abrir o correio e, por causa disso, mudei de hábitos. Dei o correio a uma jovem colaboradora e dei-lhe ainda indicações para rasgar todas as cartas que chegassem sem remetente e fossem reconhecidas como da família das anónimas.
Quando ela se despediu para ir à sua vida, e antes de contratarmos outra pessoa para o seu lugar, arrumámos o espaço e a secretária. No fundo das gavetas estavam arrumadas várias cartas com datas recentes prova de que ela continuava a deliciar-se com as atordoadas que chegavam pelo correio onde eu deveria continuar a ser o bombo da festa. A história diverte-me mas não acaba aqui. Hoje, com as modernices, há gente que escreve para a caixa de comentários de O MIRANTE com endereços utilizando o meu nome e somente com a finalidade de me chamarem os nomes que regra geral compõe o dicionário do melhor calão português. Não leio mas vou sendo informado de tempos a tempos e continuo a divertir-me sabendo que há gente que ainda acha que o anonimato é uma força da natureza humana. É sim senhor; quando as pessoas fazem o bem e não precisam de reconhecimento. Quando querem criticar e não têm coragem de dar a cara, o anonimato, tratado nas grandes organizações como é a nossa, serve como lição para aprendermos a trabalhar mais e melhor sem concessões e sem medo de dar o peito às balas. JAE

quarta-feira, 22 de maio de 2013

A mão de Deus

Há um forno comunitário para cozer pão na aldeia da Pereira; corre uma ribeira na charneca entre o Arripiado e Constância que nos leva a paraísos que só costumamos ver nos livros e nas revistas que falam de viagens a lugares inesquecíveis; no “Outeiro Alto”, que é uma quintinha mesmo junto ao Parque Ambiental de Santa Margarida, vive o “Vento”, um cavalo de respeito que se deixa montar por qualquer sopro de vida; em Constância, junto ao Tejo, o “Pezinhos no Rio” tem uma cozinha espectacular com a sopa de peixe e a sopa da pedra a vulgarizarem (no bom sentido, é claro) os chefes de cozinha dos restaurantes típicos de Almeirim; a Ponto Aventura é gerida por um senhor chamado Carlos Silvério que tem uma excelente vocação para a direcção e para a organização de desportos radicais; a praia fluvial da Aldeia do Mato não é para os lados da Nazaré; é mesmo aqui, ali onde se chega de moto ou de bicicleta para os mais desportistas; e na aldeia podem comprar-se amendoins e tremoços avulso em quantidades e a preços que já não se usam.
 Quem é que não sonha ser dono de um pedaço de terra para construir uma casa, um charco, e no meio do quintal uma vedação para criar ovelhas, cabras, pavões e galinhas? Ali, a dois passos do Parque Ambiental de Santa Margarida, em todos aqueles conjuntos de casas que dão nome a aldeias de que sempre ouvimos falar, vive- se verdadeiramente o espírito comunitário do século passado mas percebe-se que estamos no primeiro mundo, e que só a pobreza do chão, dos telhados das casas e das ervas dos caminhos, é verdadeiramente franciscana; o resto é território espiritual para qualquer pessoa explorar até se sentir dona do mundo.
A Nersant, com a organização do Challenger, proporciona uma das iniciativas mais brilhantes de serviço à região ribatejana e à sua beleza natural. Esta prova devia ser filmada todos os anos e mostrada no Centro Cultural de Belém, aos domingos, em ecrã gigante, aos meninos e às meninas que julgam que o Tejo nasce em Cascais e depois sobe até Vila Velha de Rodão; que galinhas, ovelhas e raposas são todas aquelas criaturas que as mães dizem para eles evitarem enquanto mudam do jardim do Príncipe Real para a Avenida da Liberdade, do Largo do Carmo para o Rossio ou da Praça do Comércio para o Parque Eduardo VII.
Não jogamos a partida de bilhar nem abri o computador. Neste último fim-de-semana não escrevi uma linha nem abri um livro. Mas não me livrei, no domingo à noite, de ver no cinema o recém estreado “Assalto à Casa Branca”, pura propaganda à política dos americanos que sempre acham que os europeus, alguns europeus, são estúpidos por aceitarem viver em aldeias encantadas como a Pereira, onde as armas nucleares são os excrementos dos animais que fazem crescer uma couve mais depressa que a mão abonada de Deus. JAE

quarta-feira, 15 de maio de 2013

O maior aldrabão é político


Às vezes pergunto-me sobre o que me move! Que razões tenho para continuar a fazer as mesmas coisas de há vinte anos e a cair nas mãos de passarões e passaronas que me usam como quem usa sabão azul. O que é que eu ganhei em ter passado tantas noites sem dormir a queimar as pestanas, trabalhando no duro durante o dia, para agora me entregar a um projecto que tem apenas como missão fazer serviço público?
Só tenho uma resposta: como gosto da política mas não suporto a vida política, o jornalismo permite-me a mesma intervenção pública e preocupada sobre o colectivo em que estou inserido. Também eu penso que se a sociedade falhar eu também falharei como homem e como cidadão. Não consigo ainda pensar que chegou a hora de viver dos rendimentos que é coisa que muita gente faz, até antes de ter rendimentos, vivendo, é claro, dos rendimentos dos outros. Tenho projectos de vida fantásticos e excelentes condições para os concretizar mas isso obriga-me a afastar-me do meu trabalho dos últimos anos. Todos os dias penso no assunto. Todas as manhãs salto da cama e digo: é hoje que dou a estocada final no toiro que sou eu próprio e deixo que a espada ensanguente o meu cachaço.
O maior mentiroso que encontrei na minha já longa vida disse-me, muito antes de eu perceber que ele era um aldabrão, que ia candidatar-se a um cargo público porque estava na hora de devolver ao país aquilo que o país lhe tinha dado. Vim a saber mais tarde que afinal ele foi para a política porque precisava de safar a vidinha que estava pelas ruas da amargura. Nunca mais saiu; troca de amigos como quem troca de camisa: e só falta que um dia destes caia na fossa que é o que acontece a todos os que só mexem em esterco.
Uma última nota: a Câmara de Santarém, de Francisco Moita Flores, agora de Ricardo Gonçalves, está numa classificação vergonhosa relativamente às que pagam mais tarde aos seus fornecedores. Para ganhar a câmara há quase oito anos uma das bandeiras políticas de Moita Flores foram as dívidas dos seus antecessores. Alguém tem dúvidas que a palavra desta gente já não vale para nada?

quarta-feira, 8 de maio de 2013

A vergonha do Tribunal de Almeirim


A situação do Tribunal de Almeirim é a maior prova da vergonha nacional em que se encontra a nossa justiça e o exercício político dos autarcas com responsabilidades na qualidade da nossa vida. O tribunal não funciona pura e simplesmente. Neste caso tem juízes mas só tem uma sala para as muitas audiências em espera. Confrontado com esta situação, Joaquim Sousa Gomes disse a O MIRANTE que já tinha feito o que estava ao seu alcance, que era trazer o tribunal para a cidade. Segundo ele, o resto, que é tudo, já não é da sua competência. Enfim, Sousa Gomes conquista um tribunal para a sua cidade e depois dão-lhe um presente envenenado e ele diz que não é visto nem achado no assunto.
Só para termos uma ideia do escândalo, já ouvi advogados dizerem a quem tem processos naquela Comarca que lhes mande rezar por alma. Se conseguir um acordo, mesmo mau, não pense duas vezes, pois os processos naquele tribunal vão apodrecer nas prateleiras, dizem todos os advogados com quem já falei, sejam de Lisboa, Porto ou Santarém.
É assim que funciona o país; temos cidadãos de primeira e de segunda; os de segunda são aqueles que se deixam enganar pelo governo da nação e pelo governo local. O Tribunal de Almeirim deve ser caso único no mundo: tem dois juízes mas só tem uma sala de audiência. Não acham que o assunto revolta para quem tem lá os seus processos desde que o tribunal abriu as portas? Não dá vontade de perguntar ao presidente da câmara e aos seus vereadores se não têm dois dedos de testa para devolver ao Governo o presente envenenado que prejudica os seus munícipes muito mais que a estrada por alcatroar ou até o saneamento básico? Cagar para uma fossa no quintal, beber água em casa de um quartão de barro ou alumiar a casa de noite com uma lamparina de azeite é mais à frente que ter um tribunal ao pé da porta que em vez de fazer justiça deixa que a justiça se faça com o tempo, ou seja, que as pessoas morram e outras desistam e se conformem com os interesses instalados e com a injustiça.
O MIRANTE noticiou na edição da passada semana que há um juiz de círculo cível a fazer “o jeito ao diabo” e a recuperar os processos mais antigos com julgamentos em Santarém. Deus o abençoe. Ainda há gente boa na Magistratura. Gente que não se acomoda. O que se diz é que estarão lá mais de 12 mil processos. Oficialmente dizem que é metade. Mas a gente sabe como são os números oficiais. Nem daqui a uma eternidade teremos justiça em Almeirim num tribunal com juízes mas sem salas para realizar audiências. É uma vergonha e remete-nos para os tempos de antanho quando se fazia justiça pelas próprias mãos. JAE

terça-feira, 30 de abril de 2013

Eu amo o 25 de Abril


Eu amo o 25 de Abril. Estou condenado em tribunal, por enquanto, por ter escrito que um político, no exercício das suas funções de político, era o maior idiota político que conhecia; e tenho em cima das costas um pedido de execução do tribunal no valor de 3 milhões de euros, só para contar dois casos que me obrigam a ser jornalista, a medo, em certas ocasiões. Mesmo assim, sabendo que Portugal é um país cada vez mais perigoso para o exercício da cidadania, eu amo o 25 de Abril.
Se um dia me espetarem um punhal nas costas e não morrer da punhalada continuarei a amar o 25 de Abril por tudo o que a Revolução dos Cravos significou para os homens da minha geração que, nessa altura, tinham 18 anos e não frequentavam o liceu e, alguns deles, nem saíam da escola com a 4ª classe.
O Mundo que vivemos hoje é mil vezes mais interessante que o de há 39 anos. Mas há realidades que parecem recuperadas de há meio século. O desemprego cresce a um ritmo galopante mas a maioria dos desempregados prefer morrer à fome que aceitar trabalho que não possa ser feito com luvas de pelica; há gente bem empregada que de um dia para o outro cavalga as costas do patrão como se ele fosse o palerma de serviço à economia portuguesa quando não à economia familiar de cada um dos seus colaboradores; há pessoas que ganham o ordenado mínimo e têm vários cartões de crédito daqueles a quem os banqueiros aplicam taxas de juros de 40%; há milhares de jovens desempregados que não sabem abrir a boca para se apresentarem numa entrevista de emprego.
Eu amo o 25 de Abril mas reconheço que faz falta gente mais bem preparada para governar o país. Esta gente da política, salvo raras e honrosas excepções, não só é idiota como fazem de nós estúpidos e cavalgaduras ao comerem tudo e não deixarem nada como diz o refrão da cantiga do Zeca Afonso. Concordo em boa parte com os pessimistas do regime: esta gente é má demais para levar isto a bom porto. Não falo só dos políticos; falo de todos nós, incluindo a classe jornalística que não sabe criar empregos, quando a forma de comunicar é cada vez mais barata e está ao alcance de todos.
O nosso futuro em liberdade está em risco e os homens livres já têm, neste momento, as mãos atadas embora ainda possam gritar por socorro. Vivemos um tempo que não é para os poetas nem para a poesia. Por isso vou mais uma vez à manifestação do 1º de Maio à Avenida da Liberdade em Lisboa. Vou só ver. Não tenho vocação para desfilar seja em que situação for. Mas sou homem de andar na rua com o punho erguido e não tenho vergonha de confessar que nasci comunista e arrisco-me a morrer anarca.

terça-feira, 23 de abril de 2013

As cheias do Tejo e Rafael Duque o Ministro de Salazar


“Chegou a hora dos postes mijarem nos cachorros”. O ditado foi ouvido do outro lado do Atlântico e cada um que faça a sua leitura. Na net não há entradas para o provérbio. Provavelmente ainda não chegou à mesa de trabalho dos estudiosos da sabedoria popular.
Algumas terras do campo de Alpiarça estão ainda literalmente alagadas pelas águas da chuva e das cheias do Rio Tejo. São terras que nos últimos anos foram mexidas pelos seus proprietários de forma a ganharem o terreno que dantes servia para valados e valas. Dificilmente vai haver sol suficiente para secar tanta água represada. Em algumas daquelas terras as culturas deste ano estão comprometidas. Este é o preço da ganância? O preço da irresponsabilidade? O preço a pagar por ter deixado de existir uma autoridade que fiscalize e seja boa conselheira ao mesmo tempo? O Vale do Tejo é a região de onde sai a grande fatia da produção agrícola nacional. Não se percebe a falta de ordenamento e de regras. O assoreamento do Tejo vê-se pelos buracos que a água fez nas terras confinantes com o rio; e a água só correu desalmadamente durante umas horas; imagine-se uma cheia como as de antigamente. Metade da areia que o Tejo tem a mais um dia vem parar ao meio do campo. Ai vem vem. Entretanto vamos encolhendo os ombros e assobiando para o lado como se o problema fosse com os espanhóis.
O jornal “Público” publicou no dia 13 de Abril um artigo de opinião de Miguel Motta, professor catedrático jubilado, que tratava fundamentalmente do tema agricultura e da diferença entre a capacidade da produção holandesa e portuguesa. Diz ele, para acentuar o atraso dos portugueses que ao longo de um século o único ministro da Agricultura que compreendeu a importância da ciência na agricultura, e fez a única reforma que deu um enorme avanço a este sector foi o dr. Rafael Duque, com a sua excelente legislação de 1936 (:). Estamos conversados? Parece que sim. Não li nada, a contrapor esta opinião, por parte dos grandes defensores das ovelhas do rebanho abrilista a que me orgulho de pertencer.
JAE

quarta-feira, 17 de abril de 2013

João de Matos Filipe


Trancanis da proa/braços/ cavernas/ traste/ cágado do remo/ chama/ costado/ tábua das bufas/ buraco do trapeiro/ leito/ entre pares/ chumaceira/ draga/ vertedouro/ fiéis/ proa.
Parece um poema surrealista mas não é. São descrições de algumas das peças e espaços de um barco picareto identificado no livro “Cultura e Artes da Pesca Tradicional em Ortiga-Mação”, da autoria de João de Matos Filipe. O livro tem sido pretexto para o autor divulgar a sua paixão pelo Rio Tejo e dar testemunho das muitas horas de estudo sobre os 8 Km de rio que bordejam o território da Ortiga, as tradições e a azáfama dos pescadores. Luís Mota Figueira, Professor Coordenador do Politécnico de Tomar, diz na apresentação do livro que João de Matos Filipe “ iluminou uma parcela muito significativa das artes da pesca tradicional, porque integra as provas, os testemunhos, as evidências e a sua reflexão profissional, como que elaborando um fresco sobre as artes do rio, cuja composição e estética acabam por resultar da naturalidade com que esboça, pinta e nos explica a realidade interpretada”.
O livro é ainda uma homenagem ao povo da Ortiga e ao mesmo tempo um preito ao rio da nossa infância que, para muitos de nós, é sinónimo de lazer, trabalho e prosperidade. Quem cruza o rio Tejo todos os dias, como é o nosso caso, e aproveita os tempos livres para fruir do seu leito e das suas margens, só pode estar agradecido ao historiador local que nos devolve em conhecimento e sabedoria o nosso “Rio de Emoções” parafraseando Carlos Cupeto que assina o prefácio.
JAE

sexta-feira, 1 de março de 2013

O único jornal de referência que não pertence a um grande grupo económico*

A forma como nos organizamos, em termos jornalísticos e comerciais, o conceito de empresa jornalística que criamos ao longo dos anos não tem paralelo em nenhum órgão de comunicação social nacional ou regional. Nestes 25 anos de existência já nos viraram do avesso algumas vezes.

Cumprimento especialmente a nossa anfitriã, Maria do Céu Albuquerque. Este momento é único, porque é a primeira vez que Abrantes acolhe uma das nossas iniciativas que não estão relacionadas com publicação de livros ou outras iniciativas culturais.

Cumprimento todos os restantes amigos e convidados, algumas de quem sou também amigo e admirador, num amplo abraço já que para nós não sois público mas convidados especiais, aliás, muito especiais, tal foi o cuidado que a Joana e a equipa de O MIRANTE procuraram ter na organização da iniciativa e no convite a todas as pessoas que estão hoje aqui presentes, nomeadamente os amigo e familiares das personalidades que os jornalistas de O MIRANTE elegeram.

Aproveito a ocasião para deixar aqui um testemunho que eu acho que não nos fica mal recordar. Noutros tempos, quando éramos mais jovens e mais pobres de espírito e, logicamente, mais sedentos de vida, caminhamos para Abrantes centenas de vezes fazendo o caminho da estrada nacional que é muito difícil mas muito bonito para quem gosta da paisagem e tem amor ao rio.

O médico José Vasco, que era uma figura desta terra, faz parte das minhas principais memórias. E, embora por razões bem tristes, hei-de viver até à eternidade e jamais esquecerei os tempos em que entrava no seu consultório ou ficava cá fora a conviver com os inúmeros doentes que vinham a Abrantes de todas as terras à volta.
Já lá vão mais de trinta anos mas parece que foi ontem. E a figura do medico amigo jamais me sairá do pensamento embora não fosse eu o seu doente.
Fica aqui a homenagem a um homem que eu sei que muita gente ainda lembra como se ainda ontem se tivesse cruzado com ele ou visitado no seu consultório.

Como é do vosso conhecimento O MIRANTE comemorou 25 anos em Novembro. É uma data que nos enche de orgulho embora saibamos que temos muito para fazer. Passo a passo, com mil cuidados umas vezes, arriscando quase tudo muitas outras, fizemos de O MIRANTE um jornal de referência para uma região, um jornal de referência como não há outro na nossa área de influência. Parece fácil manter a qualidade editorial e crescer todos os anos de forma a cumprirmos a nossa missão. Parece mas não é. O MIRANTE foi quase sempre um jornal de referência também pelo volume de publicidade que manteve e que mantém nas suas páginas e em todas as edições. Somos em Portugal o único jornal de referência que não pertence a um grande grupo económico. O único não me canso de repetir. Dito assim parece uma banalidade. Quem sabe o que custa viver e sobreviver num mercado dominado por uma concorrência desleal, num mercado onde a comunicação social é dominada por patrões que ganham dinheiro noutros negócios para perderam nos seus jornais e televisões, quem sabe isto, percebe melhor e entende melhor o significado que atribuo ao facto de sermos um jornal independente, que pode praticar um jornalismo de proximidade sem a canga de um patrão ou de um investidor que precisa do jornal para servir os seus interesses pessoais ou os das suas empresas.

Não há em Portugal outro jornal que tenha um caderno de classificados como O MIRANTE. Não há em Portugal outro jornal, muito menos um jornal regional, que abranja tantos concelhos e tantas freguesias como o nosso. Não há em Portugal outro jornal' rádio ou televisão regional, que tenha no terreno uma equipa de profissionais que trabalhe tão próximo das populações, que alimente tanto as redacções de outros órgãos de informação cujos profissionais estão sentados à secretária praticando o chamado jornalismo de influência, sem levantarem o rabo das suas cadeiras almofadadas.

Não conheço outro jornal em Portugal que dê tanto espaço aos leitores. E mais daríamos se vivêssemos numa região, num país, onde a sociedade civil fosse mais exigente e consciente do seu papel na conquista dos direitos de cidadania.

Não conheço outro jornal que tenha tantos processos em tribunal como O MIRANTE. Caso para dizer que nesta altura temos a cabeça no cepo; e se a justiça ou o sistema de justiça se for degradando como tem sido público e notório de certo que não teremos hipóteses de sobreviver. Não morremos do mal, não cairemos nas muitas batalhas que travamos todos os dias, mas podemos morrer no campo de batalha traídos pela falta de justiça que tanto defendemos a tentamos respeitar no nosso trabalho diário.

Nada de queixinhas. Mas as liberdades conquistadas com o 25 de Abril já não são o que eram. Principalmente para os que teimam em lutar com as armas do trabalho, da independência e assumem a rebeldia na defesa de causas que são tão velhas como a honestidade, sem olharmos aos riscos de vivermos numa sociedade e numa época de lobistas, sindicatos e sindicalistas manhosos.

A forma como nos organizamos, em termos jornalísticos e comerciais, o conceito de empresa jornalística que criamos ao longo dos anos não tem paralelo em nenhum órgão de comunicação social nacional ou regional. Nestes 25 anos de existência já nos viraram do avesso algumas vezes. Uma delas alterando as regras do PP. Só num país de velhos do Restelo que não saem de Lisboa e quando viagem para o estrangeiro não passam de Badajoz. Mais recentemente cortando toda a publicidade que facturávamos junto de entidades concelhias que eram e deveriam continuar a ser uma fonte de receita que ajudasse a pagar o serviço público que prestamos á comunidade. Este último caso só não nos derrubou ainda porque temos bons alicerces Porque estamos sempre preparados para o pior. Porque nunca embandeiramos em arco nem dormimos na forma. Mas seria injusto não referir a traiçãozinha deste Governo em que fomos o alvo principal. O Governo da nação mandou cortar toda a publicidade obrigatória de certos actos públicos, que ajudavam à transparência da coisa publica, e nós, que ao longo dos anos fomos semeando e conquistando a posição que achamos que deve ter um jornal regional, de um dia para o outro ficamos a chuchar no dedo.

Infelizmente não estamos sozinhos. Para mal do país as pessoas também estão a perder uma boa parte das suas reformas. E muita dessa gente só se reformou depois de uma vida de trabalho e de descontos chorudos para o sistema. Ao contrario de outros que se reformaram com 40 e poucos anos e esses sim merecem ser penalizados se é que alguém merece que o Estado falte com aquilo que prometeu seja lá ele quem for e tenha lá a idade que tiver já que as leis são para cumprir e não para que os políticos façam delas gato sapato.

É um grande desafio editar um jornal como O MIRANTE, semanalmente no papel e todos os dias na Internet É com muito orgulho que mantemos a qualidade editorial do nosso jornal e continuamos a conquistar os anunciantes da nossa região.

Para nós não chega sermos um exemplo a nível nacional e um projecto jornalístico cheios de desafios que atrai muitos daquelas que acham que a solução para as más notícias está na capacidade e no poder para matar o mensageiro.

Quem lê o nosso jornal todas as semanas e o recebe a um preço literalmente abaixo do seu custo, acha normal e esfrega as mãos de contentamento. E nós agradecemos. É para isso que trabalhamos todos os dias. Corremos por nossa conta e assumimos os riscos por inteiro. quando não chegarem os 7 dias de trabalho, as 12 horas por dia começamos a trabalhar de noite como os morcegos. E se houver alguém que conheça outra forma de resolver um problema de uma empresa que não seja com mais trabalho e com mais suor e inspiração então temos que repensar toda a nossa vida porque os deuses devem estar loucos e quanto a nós não deverá ser caso para menos.

Os números da marktest que atestam a influência dos jornais junto dos leitores, não nos deixam mentir. O MIRANTE é o primeiro jornal entre todos na sua área de influência ao nível da fidelidade e da afinidade. Nem o os jornais mais populares, por mais sangue que deitem das suas páginas ou ao contrário, por mais gente influente que escreva nas suas colunas, conseguem roubar-nos a liderança nos 23 concelhos onde somos e queremos continuar a ser o jornal da terra.

Por isso é que estamos aqui. Por isso é que temos a independência e a autoridade para premiarmos pessoas como o Senhor José Bioucas, ou o Senhor Joaquim Santana só para falar agora dos mais antigos e dos mais vividos dos premiados deste ano.

Um dia já distante o Bispo de Santarém, depois de ser entrevistado por dois jornalistas de O MIRANTE, perguntou-lhes, para fazer conversa, o que é que eles iam fazer a seguir. Quando lhe disseram que iam trabalhar para a redacção ao lado de outros camaradas jornalistas o Bispo abriu a boca de espanto e perguntou se era mesmo verdade que eles trabalhavam a tempo inteiro no jornal.

Há dias uma colega foi facturar a uma empresa aqui bem perto de Abrantes . O cliente, rendido à simpatia e ao profissionalismo da colega, perguntou-lhe com o dedo apontado quanto é que o patrão lhe pagava porque ele dobrava a parada.

Só precisava que ela soubesse mexer bem num computador e que lhe desse banho porque ele já tinha caído já duas vezes na banheira.

Um dia alguém mandou parar o carro de um nosso colega, também lá onde nem o diabo se lembra que vive gente, e desabafou com ele pendurado na janela da viatura; Vocês por aqui, é pá é uma alegria ver um carro de O MIRANTE . O vosso jornal é leitura de toda a gente deste lugar onde nem os políticos vêm em tempo de campanha eleitoral.

Temos mil histórias para contar desta vida de andarilhos e de escrita pela noite dentro. Não temos tantos quilómetros nas pernas como os músicos dos Quinta do Bill, nem tantas horas de olho fino como o Nené a ver para que lado marram os toiros, Nem sabemos tanto de politica como a deputada Carina Oliveira, que tem a escola da Assembleia da Republica, Jamais conseguiremos ser jornalistas de proximidade como o Dionísio Mendes é presidente de câmara; Nunca chegaremos aos calcanhares do Mário André a deitar a mãe a uma dificuldade, por muito anos que vivamos nunca mais conseguiremos apanhar o passado antifascista e cheio de referências culturais, nos tempos difíceis que vêm de outros séculos da Euterpe Alhandrense, e por muita música que possamos ouvir e instrumentos que aprendamos a tocar ficaremos sempre de boca aberta a ver como se organizam em termos empresariais e associativos o Conservatório de música de Ourém e Fátima e o Sport Clube Operário de Cem Soldos. Por último: o Juventude Amizade e Convívio é um caso raro de êxito no desporto, principalmente feminino, e nós somos todos uns trambolhos se nos tirarem o ofício da escrita ou, noutros casos, a capacidade de ajudarmos a duplicar negócios com a publicidade que vendemos para o nosso jornal.
O jornalismo de proximidade obriga-nos a viver o ofício com paixão, e a trabalhar os textos e as imagens de forma aprofundada, tentando fugir ás rasteiras das nossas fontes, procurando e aprendendo sozinhos a cumprirmos as mais elementares regras da nossa profissão, sabendo que todos os dias nos cruzamos, na rua, ou por aí, com as pessoas que são alvo das nossa notícias ou que, de uma maneira ou de outra, estão retratadas no nosso trabalho.

Os prémios Personalidade do Ano, a par do Galardão Empresa do Ano que organizamos em conjunto com a NERSANT, são a nossa aposta e o nosso compromisso com a região onde vivemos e trabalhamos, e com as pessoas que ajudam a transformar a região e a fazermos o caminho do progresso, seja lá isso o que for, e demore lá os anos que demorar a fazer-se sentir nas nossa vidas e nas vidas dos nossos filhos e netos.

* Discurso lido na cerimónia de entrega dos prémios Personalidade do Ano realizada no Cine Teatro S. Pedro em Abrantes no dia 21 de Fevereiro de 2013

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

“Lavar a roupa suja”

Esta semana O MIRANTE é um pequeno repositório de versos brejeiros que anunciam as várias iniciativas organizadas na região em Quarta-Feira de Cinzas. Em todas elas
O MIRANTE esteve presente e, aqui e ali, tratado e maltratado como mandam as regras do Carnaval e dos testamentos que são escritos muitas vezes por gente pouco letrada mas muito sabida e, em muitos casos, por pessoas que não só sabem escrever como sabem fazer crítica social.
Fica aqui uma palavra de apreço para um grupo de jovens da Chamusca que não só continua a tradição, com os velhos de pantufas em casa a morrerem antes do tempo, como melhoraram e muito a qualidade “literária” do testamento embora toda a liberdade que sempre é permitida, e deve ser abusada, nestas alturas de “lavagem da roupa suja”.
Pela primeira vez O MIRANTE publica uma reportagem do testamento lido na Póvoa de Santa Iria. Já não era sem tempo. Mesmo assim a reportagem fica aquém daquilo que o acontecimento merece. Esperamos melhorar no próximo ano e estarmos mais atentos.
Não é normal que em cidades como a Póvoa de Santa Iria o pessoal escreva testamentos que não ficam a dever nada àqueles que são escritos para comunidades pequenas onde todos se conhecem. Só quem vive no seio destas grandes comunidades percebe que tudo funciona como nas pequenas. A diferença está apenas na diversidade. O resto é tudo igual. Quem julga que as grandes cidades como a Póvoa não têm vida própria e gente bairrista engana-se redondamente. Basta estar atento ao trabalho associativo e às actividades que se organizam todos os dias e muitas vezes enchem os fins de semana. Mesmo que a participação seja escassa ninguém desiste. E, ao contrário do que acontece nas comunidades mais pequenas, os dirigentes marimbam-se para o presidente da junta e fazem tudo, ou quase tudo, como se a política não existisse. Mas é claro que os políticos não passam despercebidos e levam na cabeça nas alturas certas.
Recuperamos uma das quadras deste Enterro do Galo onde O MIRANTE foi citado e onde um presidente de junta de freguesia, que representa uma das cidades mais identificadas como dormitório de Lisboa, levou que contar.

“Só em festas importantes/Na Póvoa de Santa Iria/Aparecem os representantes/Da Junta de Freguesia.
Julgam-se gente importante/E não se juntam ao povo/Foram notícia em O MIRANTE/e não vimos nada de novo.
O entrudo e amigões/Numa tarefa conjunta/Deixa merda e cagalhões/Para os engravatados da junta”.

Comentário às noticias:
http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=588&id=89532&idSeccao=10057&Action=noticia
http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=588&id=89534&idSeccao=10057&Action=noticia
http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=588&id=89535&idSeccao=10057&Action=noticia
http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=588&id=89536&idSeccao=10057&Action=noticia

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Morreu o “Quim” Machado e o povo da Chamusca voltou a chorar


Uma crónica que também é notícia sobre a vida e a morte de Joaquim Ricardo Banha Machado.

Morreu com 62 anos, na Chamusca, Joaquim Ricardo Banha Machado, farmacêutico de profissão, considerado um profissional de corpo inteiro e um homem de bom coração. 
Com a morte de Joaquim Cabeça, o médico dos pobres, na altura em que ter médico de família era um luxo (já caminhamos para lá outra vez), Joaquim Machado ocupou  o seu lugar no coração do povo da Chamusca  e, por mérito próprio, tornou-se o amigo e conselheiro de meio mundo acudindo a pobres e a ricos, a doenças e a simples conselhos, como se a sua vida estivesse predestinada a servir a vida dos outros. 
Há meses que se sabia da grave doença de que padecia. Há semanas que os ouvidos mais atentos das pessoas mais amigas temiam ouvir os sinos da igreja e o seu toque a finados. Cada vez que tocavam era quase natural perguntarem  em surdina quem tinha morrido sempre com o medo de ouvirem dizer que tinha sido o Machado da farmácia.
Desde que se soube do seu último internamento que se esperava o pior. “Ele ajudou tanta gente e agora ninguém o pode ajudar a ele”. “Está condenado, dizem os médicos”, ouvia-se por toda  a Chamusca ainda há dias na boca de pessoas que, para lhe prestarem homenagem antecipada, contavam antigas conversas, memórias de há trinta anos mas também de há poucos dias. Nalguns casos, como podemos testemunhar, a saudade já se manifestava por simples palavras roubadas a propósito do avio de uma receita ou de um sorriso maroto arrancado à custa do seu superior pessimismo sobre o estado actual do seu Sporting. 
“Pagou receitas do bolso dele a muita gente pobre; trabalhou fora de horas e só Deus sabe o que é que ele fez por tanta gente”; foi isto que ouvimos e testemunhamos ao longo dos últimos dias; mas nada disto é segredo ou conversa fiada; o Quim Machado era verdadeiramente uma alma boa e um ser humano solidário sem precisar que lhe chorassem no colo ou lhe beijassem as mãos. Fazia o que tinha a fazer por dever de ofício e porque parece que Deus tem sempre alguém na terra para ajudar naquilo que Ele não pode ajudar por ser Deus e ter muito trabalho com as divindades.
No passado domingo, por volta das 13 horas, recebemos a notícia da sua morte. Tinha acabado de fechar os olhos e o coração tinha estourado finalmente. Foi antes de almoço. Foi antes de misturarmos na boca o vinho  com o pão ainda quente do forno a lenha. Ficamos durante alguns minutos à espera de ouvir tocar os sinos. Depois esperamos uma hora; depois esquecemos o tempo e acabamos também por esquecer os sinos da igreja da Chamusca que, segundo nos contaram, tocaram às  quatro da tarde.
Eram mais ou menos 17 horas de segunda-feira quando as pessoas que enchiam a igreja matriz da Chamusca começaram a sair da missa de corpo presente pela alma do Joaquim Ricardo Banha Machado, com as olheiras bem fundas, os olhos cheios de água e os semblantes carregados até ao sobrolho. Na rua havia mais gente do que aquela que cabia na igreja. O padre, que é novo na terra, e não chegou a conhecer o Senhor Machado, lembrou os presentes que lhe chegou aos ouvidos que o defunto “era pessoa de bem de alma”, frase que repetiu no cemitério antes do corpo descer à terra para avisar que fazer o bem tem os seus segredos e que o Joaquim fez o bem a muita gente que ninguém sabe quem, nem o quê, e é nisso que está a grandeza do Homem.
Quando a urna desceu os degraus da igreja os ricos, os pobres e os remediados choravam todos as mesmas lágrimas de água e sal que se afogavam no lenço ou caíam simplesmente pela cara abaixo. O carro funerário deslizou e logo se percebeu que ia passar em frente da farmácia S. Pedro onde o Quim trabalhava. Breve paragem no local para se ouvirem outra vez os choros baixinhos dos que não têm vergonha de chorar mas têm medo de incomodar com o barulho do choro. E para trás ficava a farmácia e o lugar onde o corpo foi velado, embora por pouco tempo, e onde se deslocaram muitas pessoas idosas de bengala e de andarilho. Gente que já não pode com o corpo mas que mesmo assim quis prestar homenagem ao  amigo das horas difíceis que é quando a carne dói e a alma não aguenta.
Fez-se um cortejo como já não é hábito acontecer em funerais. O trânsito não circulou durante o trajecto do Largo da Misericórdia até à curva da rua estreita que dá acesso ao cemitério da Chamusca. Junto ao carro só se murmurava. Cá atrás tocavam telemóveis, as pessoas cumprimentavam-se, os automobilistas iam interagindo com as pessoas que conheciam, o senhor José Ferreira empurrava a bicicleta e puxava pelos sapatos como se fossem uns chinelos; o Senhor Manuel puxava pelas pernas tortas e balançava o corpo como quem faz exercício na água; muita gente de braço dado, especialmente as mulheres, mas também muitos homens sozinhos, de cabeça baixa e mãos nos bolsos a contarem até cinco. Reconhecemos gente que já não víamos há anos e que nos pareceram muito mais velhas; reconhecemos outros que vieram de longe e que pareceram mais novos. Ia no funeral gente de todos os extractos sociais; os mais humildes dão sempre mais nas vistas porque vestem o fato novo; não usam telemóvel nos funerais; espelham melhor a dor dos outros porque a sentem como desgraça própria. Beiço grande e ombros caídos nos homens mais velhos; sinal de luto mas também de resignação nos homens de meia idade; costas curvadas e corpo balançado para a frente de forma a vencer o longo caminho era como andavam os mais velhos a quem o Quim Machado certamente fará mais falta com esta despedida tão apressada para quem tinha só 62 anos e gostava tanto do seu trabalho, da família e dos amigos.
Quando o caixão desceu à terra era quase noite. Já havia no céu uma lua em quarto crescente que desenhava um rosto de criança a sorrir. A Susana, filha única do Joaquim Machado, terá ouvido certamente algumas pessoas  darem-lhe os pêsames dizendo que ela devia estar orgulhosa do pai que tinha. A mãe do Quim, debruçada sobre o caixão, parecia chorar na voz baixinha do padre que encomendava o seu filho a Deus pela última vez ao cimo da terra. Depois de se ouvirem as primeiras pazadas de terra  a caírem em cima do caixão foi-se o murmurinho que ficou de duas avé marias cantadas como num coro de igreja; e começaram a ouvir-se pessoas a tossir, gente a desmobilizar que quase não faziam peso ao chão mas geravam um som que parecia vir de um vespeiro, de uma frase de Leibniz que diz que “quando canta para si, Deus canta álgebra”.
George Steiner diz que “morrer é deixar de conversar” no seu mais recente livro editado pela Relógio D’ Água, “A poesia do Pensamento”. Há mil razões para continuarmos a procurar na literatura uma resposta para a perda. O próprio Steiner cita Holderlin neste seu livro para concluir que “ser só e sem deuses é a morte. Nem o próprio ser humano que mais amamos pode pensar connosco”.
Este texto é uma tentativa de ouvirmos ainda a voz do Joaquim Machado a dar troco ao José “Prior” e aos outros amigos com quem fazia tertúlia e comentava os últimos desaires do seu Sporting; uma tentativa de libertar o espírito da agitação e da angústia, pois, como dizia Lucrécio, “a morte não pode ser vivida”, “situa-se inofensiva fora da existência” (Steiner).

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Um livro que conta a história de um rio*

Quase toda a gente tem a mania de dizer que vivemos num mundo global; que viver em Tóquio ou Londres é como viver em Mação ou Abrantes. Os extremos tocam-se. Pode ser assim na teoria; na prática é diferente. Ninguém é de lugar nenhum do mundo se um dia não for da sua própria terra; cidadão da Ortiga ou de qualquer outra cidade ou aldeia do mundo.
João Filipe, o neto do “Ti Zé Povinho”, não quis deixar morrer as memórias que formaram o Homem e o cidadão. E, aproveitando a paciência, a arte de escrever e de contar que Deus lhe deu, exercendo uma actividade cultural no verdadeiro sentido da palavra, que é transmitir conhecimentos dos valores e dos comportamentos que se aprendem de geração em geração, prestou uma singular homenagem ao povo de Ortiga escrevendo um livro que é uma homenagem ao seu povo e à sua História, sendo ao mesmo tempo uma homenagem ao rio da nossa infância que é sinónimo de lazer, trabalho e prosperidade.
Ser ortiguense, para alguns, é muito mais importante que ser lisboeta, parisiense ou londrino. Sabem isso os que nasceram numa terra e têm orgulho, não só do lugar onde nasceram como do lugar onde nasceram os seus avós e os seus pais que testemunham esse amor à terra e às tradições e os valores culturais que, esses sim, são tão importantes localmente que ganham o estatuto de património na Ortiga ou em Lisboa.
Ao lermos o livro de João de Matos Filipe podemos recuar a 1583 e ficamos a saber pela pena do autor sobre a história da fundação da aldeia da Ortiga mas também sobre a história do Caneiro de Abrantes que não deixa de ser significativa para compreendermos os homens de hoje tão entretidos com a política do betão e dos interesses milionários das companhias aéreas.
Ao ler a carta de João Antonelli ao Rei Filipe II, para que o Caneiro de Abrantes deixasse de ser um empecilho ao desenvolvimento do Rio, recuei três dezenas de anos e lembrei-me das promessas mais recentes dos nossos políticos que organizam “casamentos e baptizados” em nome da regularização do leito do rio e, que eu saiba, tudo não passa de politiquice na sua mais amanhada forma de se evidenciar.
Este livro pode ser lido pelos ortiguenses que, por ele, podem encher o peito de orgulho mas também pode ser lido pela generalidade dos portugueses que se interessam pelos problemas do país e, especialmente, pela sua história de ontem e de hoje.
O Caneiro de Abrantes faz-me lembrar, salvo as devidas distâncias e o contexto, a política de extracção de areia que está implementada no leito do rio Tejo e a forma como as autoridades vigiam as marachas e os usurpadores do espaço tão importante para manter a segurança de pessoas e bens. E ao tomar consciência da realidade do rio de há 500 anos, lendo o livro de João de Matos Filipe, não pude deixar de sorrir com a leviandade com que hoje aceitamos a forma como o rio é cuidado e preservado; como muitos de nós vão fazer vida para Lisboa e quando regressam às suas terras, seja na Ortiga ou na Chamusca, não sabem fazer mais nada do que chegar ali abaixo e “mijarem para o Tejo para ver se ele cresce”.
JAE

Texto lido na apresentação do livro de João Filipe na Ortiga.

Comentário à noticía: http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=581&id=88386&idSeccao=9906&Action=noticia