segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

2014: uma batalha

Pouca conversa; penso e digo em voz alta antes de iniciar a escrita deste texto que vai ser o último de 2013. Quando nos lerem o ano velho já lá vai. Que faça boa viagem lá para os fundos da gaveta em que vai ficar para a História. Foi um dos anos mais importantes da minha vida: vivi situações absolutamente dramáticas que julgava impossíveis. Vivi outras tão boas que só podem ser reflexo das alegrias que são concedidas a todos os que começam a entrar na idade dos moribundos. Não sei fazer balanços nem resumos; para mim a vida é uma viagem com encontro marcado e “quem fala da estupidez geral deve saber que lhe não é imune, pois até Homero dormita; deve assumi-la como risco e destino comum dos homens, consciente de ser por vezes mais inteligente e por vezes mais tolo do que o vizinho (...), porque o vento sopra onde quer e ninguém pode nunca ter a certeza de que, nesse mesmo instante ou segundos mais tarde, o vento do espírito o não abandone”.
Termino o ano deixando aqui a informação de que a assinatura de 
O MIRANTE manter-se-á nos 15,50 euros em 2014; e que vamos continuar com o jornal online de borla para quem gosta de saber notícias de proximidade; num mercado em que todos se copiam uns aos outros vamos continuar a andar por aí procurando fazer a diferença no jornalismo de referência. A nossa missão é fazer serviço público; se pudéssemos oferecíamos o jornal; como não podemos vendemos ao preço mais baixo que é possível.
O mundo está cada vez mais perigoso para os jornalistas. E o que não faltam por aí são vozes transgressoras protegidas pela imunidade do sistema e com a segurança social garantida. Nós ainda somos dos que arriscamos a pele sem vendermos a alma ao diabo. 2014 será só mais um ano nas nossas vidas; uma batalha que, no entanto, nunca poderá ser mais importante que a vida; embora todos os dias deixemos um pouco dos nossos interesses pessoais nas horas a mais de trabalho que o jornalismo exige.
JAE

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

A sorte grande da Joana

Comecei a manhã de trabalho de uma sexta-feira passada com um encontro cara a cara com Antonio José Seguro na sede da NERSANT em Torres Novas numa reunião com o Conselho Geral da associação. Querem saber o que achei do encontro ? Não digo! Se ouviram os noticiários das televisões é porque já sabem. Saí a correr de Torres Novas para Constância onde Paulo Portas e Pires de Lima apadrinharam mais um grande investimento de Paulo Fernandes, o homem forte do “Caima” e da “Cofina”, um dos maiores grupos de comunicação social do país. Querem saber o que penso do que vi e ouvi ? Não digo! Mas deixo uma citação de uma entrevista recente do Miguel Esteves Cardoso ao “Expresso”; “ O Portas ainda vai mandar nesta merda”.
Saí a correr de Constância e fui editar um texto e um vídeo a Santarém a propósito de uma conversa entre Portas e Maria do Céu Albuquerque que apanhei no momento certo. Uma hora depois estava a caminho de Lisboa para assistir ao primeiro painel de um encontro de jornalistas que estava a decorrer na Escola Superior de Comunicação Social de Lisboa. Aproveitei o lanche que me acompanha quase todos os dias e pelo caminho servi-me dele para almoço. Eram quase seis da tarde quando abandonei o congresso e fui a correr para o ISEC para o lançamento do livro de José Fidalgo que tem a chancela de O MIRANTE. Casa cheia e um orgulho enorme por fazermos parte do projecto que dá visibilidade à primeira tese de mestrado em gestão autárquica daquela universidade. Saí às oito e meia e fui fazer vinte piscinas ali a dois passos onde também vou noutras alturas menos stressadas. Às  dez e meia estava a comer um prego e um sumo de frutas. Uma hora e meia depois fui ao cinema ver o filme “Hannah Arendt” no cinema Monumental. Eram duas da manhã quando entrei num terceiro andar, ali para os lados do Largo da Estefânia, e puxei três passas do meu cachimbo que me deixaram bêbado. Adormeci com um livro no peito sem saber de que terra era.
P.S. Não me lembro de quantos sinais azuis passei, em infração, ao longo deste dia; nem de quantos telefonemas fiz e recebi;  nem de quantas vezes disse a palavra “cacete”. Mas lembro-me de a Joana me ter ligado a meio do dia e gritado:” pai, saiu-nos a sorte grande”. Tantas semanas passadas já nem me lembro que “sorte grande” foi. JAE

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

O burro do Frazão

O Ricardo Salgado, que Deus tem, arreava o burro do Frazão e todos os dias, domingos incluídos, metia-o entre varais para se fazer à estrada do meio até à antiga vinha da família Pestana, ali para os lados da “Cruz do Santinho” nos campos da Chamusca. Lembro-me desse burro quase todos os dias embora já tenham passado muitos, muitos anos, porque para além de morder ainda dava coice bravio. Nesse tempo eu olhava para o burro e via um belo cavalo. Era um jovem que montava um burro com a cabeça cheia da vaidade de quem montava um puro-sangue lusitano. Ultimamente tenho-me sentido burro a puxar a carroça na ida e no regresso do campo que o mesmo é dizer da secretária onde trabalho. E embora me sinta menos majestoso que o burro do Frazão, que Deus também tem no reino dos animais defuntos, a verdade é que o peso da carroça parece cada vez maior e os meus cascos já não aguentam as ferraduras como noutros tempos de burro mais novo.
Entusiasmado nas últimas noites com a leitura de dois livros de Cláudio Magris, “Alfabetos” e “Danúbio”, sempre com tradução de Miguel Serras Pereira, porventura o ribatejano (nascido no Porto) mais ilustre do nosso tempo, encontrei consolação para o burro que me sinto, e de certo que sou com todas as letras, rabo e orelhas, numa página de “Danúbio” onde Cláudio Magris lembra que “é um burro e não um puro sangue de coudelaria que aquece Jesus no estábulo do presépio; Homero compara Ajax, que salva os navios aqueus resistindo sozinho ao assalto dos troianos, a um burro, cuja garupa sob a carga e as pancadas se torna tão grande como o escudo de Telamónio. A força do burro tem a qualidade dos heróis clássicos, a paciência, a tranquila, humilde e indomável constância que não sai do seu caminho e que ascende mais alto do que o arranque nervoso do nobre corcel como Ulisses ascende mais alto que Páris”.
Havia mais para citar, nomeadamente quanto à sexual “vitalidade obstinada do burro que parece vingar todos os humilhados e ofendidos”, mas não há espaço que chegue. Só tenho duas linhas para concluir que nestes últimos dias tenho-me sentido, desgraçadamente, o mesmo burro de sempre, embora com uma majestosa diferença; sou com todas as letras, orelhas e rabo, muito mais o burro do Cláudio Magris que o burro do Frazão, e é isso que vou ter em conta quando festejar a entrada no Ano Novo. JAE

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

O espaço onde Moita Flores se apresentou aos escalabitanos

Não esqueço, nem esquecerei, a pompa e circunstância com que Francisco Moita Flores se veio apresentar aos escalabitanos no Café Central já lá vai quase uma década. Foi ele que escolheu aquele lugar para se apresentar à cidade na companhia dos ilustres convidados que encheram o espaço emblemático da cidade de ontem e de outros tempos.
Fechado e vandalizado há cerca de seis anos o Café Central já era. Moita Flores foi o seu último coveiro. O autarca que passou por Santarém como o Quim Barreiros da política prometeu tudo e mais umas botas para pôr Santarém no mapa; do seu trabalho só ficaram propriedades; a compra de edifícios públicos e um aumento da dívida que já era gigantesca no tempo de Rui Barreiro e companhia.
Moita Flores foi o grande estratega para a formação da empresa Águas de Santarém; para a compra do Convento de S. Francisco e do Presídio Militar; grande homem para fazer grandes negócios com o dinheiro público; naquilo em que conta mais a disponibilidade, a arte e o engenho dos gestores foi um fiasco: um digno personagem dos seus livros de ficção.
O exemplo do Café Central é um dos melhores para percebermos como Moita Flores desprezou a cidade e esteve distante daquilo que, de forma tão duvidosa, usou sempre no seu discurso político. Moita Flores foi ao Café Central apresentar-se aos escalabitanos por ser o lugar por excelência da memória da capital do Ribatejo; no pouco tempo que esteve em Santarém deixou que o espaço se tornasse um lugar fantasma, vandalizado e com custos que davam para matar a fome a algumas famílias.
Moita Flores ficou a dever ao centro histórico de Santarém a grande maioria das promessas que fez em campanha política e que caíram em saco roto. O Café Central é o símbolo máximo da falta de vontade que ele teve em trabalhar para cumprir o prometido. JAE

Comentário à noticia: http://semanal.omirante.pt/index.asp?idEdicao=630&id=96535&idSeccao=10985&Action=noticia

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Elogio a Paulo Branco

Tenho um sorriso triste debruçado sobre os jornais onde leio notícias e opiniões sobre lugares considerados sagrados da cultura lisboeta. Sou frequentador de alguns desses lugares desde há mais de três décadas e tenho opinião sobre eles que na grande maioria dos casos não coincide com a opinião da maioria que escreve e “chora” nos jornais e na rádio.
A última novela foi sobre o fecho do cinema King. Passei lá noites memoráveis ao longo destes últimos anos a ver, sozinho nas salas, dos melhores filmes da minha vida; que maravilha que era ficar a ver cinema de autor à meia-noite no centro de Lisboa, em salas que me faziam lembrar as salas de cinema da minha terra e da minha região antes de fecharem também por falta de espectadores!
Aceitei sem revolta o fecho do cinema King como aceitei, sem ter voz para levantar, o encerramento do cinema da Golegã, Torres Novas, Chamusca, Entroncamento, Santarém, entre outros. Se não dão lucro!!!
Agradeço ao Paulo Branco as noites gloriosas que me proporcionou no cinema King fazendo de mim espectador único de centenas de sessões de cinema de autor; agradeço-lhe do coração pelas noites desassossegadas em que me senti personagem dos filmes tal era o sentimento de espanto por estar sozinho a usufruir da projeção de um filme só para mim numa sala para duas centenas de pessoas;  e como era bom digerir todas essas emoções, dos filmes e do lugar, a correr pela Avenida de Roma abaixo até chegar ao Saldanha ainda a tempo de comer um prego e beber uma cerveja no Galeto.
No passado fim-de-semana, morto e enterrado o King, voltei ao Nimas, lugar de visita muito menos regular. E lá estava toda a memória ainda viva do King, incluindo os livros e os colaboradores, e aquele cheiro tão especial e característico que assinala os lugares antigos mas onde ainda se respira profundamente e apetece ficar muito tempo à espera que chegue a hora do filme.
Pedi um bilhete com número de contribuinte e a senhora demorou meia hora a imprimir a factura/recibo. Para não variar fui ver um grande filme numa sala para 300 pessoas onde só estava eu e outra criatura tão fantasmagórica como eu. Alguém sabe o que é que vai acontecer ao Nimas num futuro muito próximo? Ai meus Deus, como eu já sinto saudades do Nimas e quero agradecer ao Paulo Branco o seu amor ao cinema e a sua imensa capacidade para continuar a ser empresário e produtor.
Há por aí alguma autarquia onde os políticos ainda se lembrem do que é a força do cinema e queiram criar uma marca de prestígio para vender ao país e ao mundo ?  JAE

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Palermas do século XXI

Há meia dúzia de “trutas” na política que nos envergonham e mais cedo ou mais tarde acabam com o pouco crédito que os políticos ainda gozam na opinião pública. Quem acompanha as notícias de 
O MIRANTE sabe o que pensamos da antiga Entidade Regional de Turismo e dos seus dirigentes nomeadamente Carlos Abreu e Joaquim Rosa do Céu almas gémeas no Partido Socialista e, pelo vistos, ultimamente também noutros interesses. Com a extinção da tal entidade de Turismo, que nos últimos anos não fez ponta de corno pela região e pelo seu Turismo, a promoção do turismo na região do Ribatejo passou para uma entidade chamada Região de Turismo do Alentejo. O caricato não fica por aqui; os concelhos de Alcanena, Ourém, Abrantes, Tomar, Torres Novas, Constância, Ferreira do Zêzere, Barquinha e Sardoal fazem parte da Região de Turismo do Centro que engloba concelhos como Castelo Branco, Coimbra, Aveiro e Viseu. Definir e aplicar no terreno estratégias locais e regionais de desenvolvimento do turismo para os concelhos da região do Ribatejo, em conjunto com Viseu ou Évora, por exemplo, é a mesma coisa que esperar sentado pela influência da região junto dos lobistas de Lisboa. Com esta lógica de governação ainda ganhamos o prémio de palermas do século XXI.
O que é mais curioso nestas alterações que se vão fazendo nas instituições que nos governam é a forma burra e arrogante como cada um puxa a brasa à sua sardinha. Dou um exemplo; a região de Turismo do Alentejo ficou com a responsabilidade de promover o Turismo em parte do Ribatejo mas os imóveis continuam propriedade da região de Turismo de Lisboa e Vale do Tejo.
O actual presidente da Região de Turismo do Alentejo é um homem do terreno e dá para imaginar quantos quilómetros é que ele deve fazer por semana para poder estar em todas. Se a sua missão já aparenta ser impossível imagine-se o seu trabalho lutando contra as burocracias e os poderes instalados que se adivinham com decisões como aquela que nesta altura impede a Câmara de Santarém de tomar posse da Casa do Campino e que é notícia nesta edição. Mário Soares tem razão; esta gente que nos governa precisa de um abanão. Mas a solução não passa por mandar para casa Pedro Passos Coelho  e elegermos  António José Seguro ou outro qualquer; na nossa opinião passa por reformar a classe política intermédia, esses sim, agarrados ao Poder e aos interesses instalados como a lapa à rocha, tudo contas do mesmo rosário que Mário Soares conhece muito melhor do que nós e não fala porque, para ele, a política já é só espectáculo. JAE